XXVI CBE: Economia gaúcha em debate
Painel discute impactos das políticas comerciais americanas sobre a indústria do Rio Grande do Sul e os desafios da sustentabilidade fiscal no país
O último dia do XXVI Congresso Brasileiro de Economia teve um painel de debates sobre a economia gaúcha. Participaram da discussão os economistas Antonio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul); Patrícia Palermo, economista-chefe do sistema Fecomercio/RS; e Giovanni Baggio, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs). O painel foi mediado pela jornalista Marta Sfredo, colunista de economia do jornal Zero Hora.
Impactos do tarifaço
O anúncio de tarifas pelo governo americano gerou incertezas para a indústria gaúcha, já afetada por desafios internos e conjuntura econômica nacional. Os especialistas avaliaram o impacto sobre exportações, empregos e competitividade, destacando também oportunidades e estratégias de adaptação.
“A gente tem acompanhado com muita preocupação. Nossa indústria vem sofrendo há muitos anos. Quando comparamos com a brasileira e a do mundo, não conseguimos avançar. Cerca de 99% do que o Rio Grande do Sul envia para os EUA são produtos industriais. Em agosto, nossas exportações caíram 19% em relação ao ano passado, e em setembro já apontam queda de 51%. Os impactos no emprego começam a surgir, mas acredito que este diálogo recente entre os presidentes Lula e Trump traz alguma esperança, porque as empresas estão muito preocupadas”, afirmou Giovanni Baggio.
“Estas tarifas não fazem sentido nem do ponto de vista americano. Não é possível atender uma reindustrialização deste jeito. Países que competem com os EUA tendem a obter alguma vantagem, e o Brasil enfrenta dificuldade para acessar o mercado americano. A China, que compra tanto do Brasil quanto dos EUA, tem aumentado compras do Brasil e reduzido dos EUA — uma vantagem temporária, que não se sustenta a longo prazo. Eu preferia que as coisas funcionassem como devem”, destacou Antonio da Luz.
“O Rio Grande do Sul, no pós-enchente, recebeu injeções de recursos para retomar o consumo, o comércio cresceu mais de 7% e agora enfrentamos a desaceleração”, comentou Patrícia Palermo. “Somos o estado mais envelhecido do país e temos desafios pela frente. Saímos da enchente bastante fortalecidos como sociedade, mas com muitas contas para pagar. O endividamento das empresas afetadas aumentou muito, num momento em que as dívidas decorrentes da pandemia ainda não estavam pagas. Com a população envelhecida e o colapso das finanças públicas, nós temos um problema sério, e quem paga essa conta é a geração que entra no mercado de trabalho agora”.
Questão fiscal: sustentabilidade e desafios
A situação fiscal do país e do Rio Grande do Sul também foi tema central do painel. Os debatedores analisaram o novo arcabouço fiscal, a elevação de despesas obrigatórias e o impacto da dívida pública, destacando a necessidade de políticas de longo prazo e ajustes responsáveis.
“O crescimento das despesas obrigatórias consome cada vez mais o orçamento. Cada real de aumento do salário mínimo acima da inflação gera R$ 400 milhões adicionais de gastos. A carga tributária já é elevada, e a sociedade não suporta mais aumentos”, mencionou Baggio. “O governo corre atrás de recursos, mas existem gastos que são obrigatórios. As despesas discricionárias diminuem com o tempo, mas saúde e educação são um desafio permanente”, explicou.
“O Brasil gasta R$ 2,4 trilhões em despesas primárias, com orçamento equivalente à fatura da dívida, sem economizar para pagar juros. Girar mais de R$ 4 trilhões a cada três anos é insustentável. Estamos pagando cerca de R$ 950 bilhões por ano em juros; se apenas R$ 400 bilhões fossem investidos, o efeito sobre o crescimento seria significativo. A insustentabilidade já não é de longo prazo, é de médio prazo, e o próximo governo terá que enfrentá-la, seja pelo amor ou pela dor”, alertou Antonio da Luz.
“O arcabouço fiscal atual não alinha regras e metas com objetivos reais. Medidas populistas, como isenções irresponsáveis, beneficiam no curto prazo, mas cobram um preço altíssimo no médio e longo prazo”, analisou Patrícia Palermo. “Fazer ajuste fiscal não é fácil nem indolor, mas é necessário. Quem não entende isso verá consequências diretas, como falta de serviços básicos em universidades e setores públicos essenciais”, concluiu.
XXVI Congresso Brasileiro de Economia
O Congresso Brasileiro de Economia ocorreu de 06 a 10 de outubro no Plaza São Rafael Hotel, em Porto Alegre, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Reconstrução, Desafios e Oportunidades”. O evento reuniu cerca de 50 especialistas e 500 participantes (online e presencial) em torno de grandes temas que impactam o futuro do país, como reforma tributária, mudanças climáticas, comércio internacional, agronegócio, desigualdades regionais, inovação, economia comportamental, educação financeira e o papel do Estado na neoindustrialização. A promoção foi do Cofecon, em parceria com o Corecon/RS.
O evento contou com o patrocínio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Vero/Banrisul, Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), Monte Bravo Investimentos, Conselhos Regionais de Economia de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Paraná e Rio de Janeiro.