Podcast Economistas: Como a inteligência artificial muda a profissão de economista?
Economista Welinton dos Santos fala sobre os ganhos trazidos pelo uso das ferramentas de IA, bem como as habilidades que devem ser desenvolvidas e os limites éticos
Nos últimos anos a inteligência artificial (IA) generativa tem transformado várias profissões e automatizado funções que, anteriormente, dependiam do trabalho mental ou intelectual. De que maneira estas ferramentas interferem na profissão de economista? O economista Welinton dos Santos fala sobre este assunto no podcast Economistas desta semana, o último da série organizada pela Comissão de que pode ser ouvido na sua plataforma favorita ou no player abaixo.
Alguns dos principais impactos da IA sobre a profissão de economista estão na rapidez do processamento de informações, e este fator pode levar a um aumento na concorrência e inovação no mercado. “Um dos principais aspectos é a automação de análises complexas, permitindo que os economistas se concentrem em tarefas mais estratégicas e criativas. A IA pode processar grandes volumes de dados em tempo recorde, identificando padrões e tendências que poderiam passar despercebidos por nós”, observa o Welinton. “Isso não apenas aumenta a eficiência, mas também melhora a qualidade das previsões econômicas. Além disso, a IA facilita a criação de modelos econômicos mais sofisticados que podem simular diferentes cenários e prever resultados com maior precisão”.
“Outro aspecto significativo é a democratização do acesso à análise econômica, porque nós temos agora ferramentas de IA mais acessíveis”, comenta o economista. “Pequenas empresas e startups podem realizar análises que antes eram exclusivas de grandes instituições. Isso pode levar ao aumento na concorrência e inovação do mercado, desafiando economistas a se adaptarem e a encontrarem novas formas de agregar valor”.
Oportunidades e ameaças
A rápida evolução da IA está remodelando de forma profunda o mercado de trabalho. Muitos temem que ela venha a substituir profissionais de diversas áreas. O avanço tecnológico desafia a forma tradicional de atuação – mas ele não traz apenas riscos. Existem também oportunidades para a profissão.
“A principal ameaça que os economistas enfrentam é a possibilidade de automação de funções que exigem análise de dados, como a modelagem econômica. À medida que a IA se torna mais avançada, tarefas que envolvem coleta e interpretação de dados podem ser realizadas por máquinas, levando a uma diminuição da demanda por economistas nessas funções”, analisa Welinton. “Essa mesma tecnologia nos oferece oportunidades significativas. Economistas que dominam a IA podem oferecer insights mais profundos e estratégicos e se tornarão indispensáveis para suas organizações. A capacidade de interpretar e aplicar resultados será um diferencial importante”.
“Além disso, a IA pode ajudar economistas a focarem em áreas mais criativas, como a formulação de políticas estratégicas de desenvolvimento econômico, onde a intuição e o julgamento humano ainda são cruciais. Outra oportunidade é a possibilidade de colaborar com outras disciplinas, como a ciência de dados e a psicologia, para entender melhor o comportamento econômico”, acrescenta o economista. “A interseção entre economia e tecnologia pode levar as a novas abordagens e soluções para problemas antigos como desigualdades e desenvolvimento sustentável”.
Análise de dados
A análise de dados em grande escala é uma das promessas trazidas pela IA. A ferramenta permite organizar dados históricos para entender como diferentes indicadores estão correlacionados. Como ela pode ajudar os economistas a formular políticas mais eficazes?
“A análise de dados em grande escala permite que economistas formulem diagnósticos mais precisos ao identificar relações complexas entre variáveis econômicas. Com a IA, é possível simular cenários e prever os impactos de políticas econômicas de forma mais eficaz”, observa Welinton. “Economistas podem organizar dados históricos em tempo real para entender como diferentes fatores interagem entre si. Essa capacidade de análise também possibilita a segmentação de dados, identificando grupos específicos dentro da população que podem ser afetados de maneira diferente por políticas econômicas”.
O economista apontou um campo em que a ferramenta seria particularmente útil: a formação de políticas públicas. “É essencial entender como diferentes demografias reagem a mudanças nas políticas fiscais ou monetárias. Além disso, análise de dados em grande escala pode ajudar os economistas a monitorarem e avaliar a eficácia dessas políticas, permitindo um feedback real e ajustes rápidos”, explicou. “Isso é fundamental em um mundo em constante mudança, onde condições econômicas podem evoluir rapidamente”.
Seria o economista o profissional mais preparado para lidar com o campo da ciência de dados? “Em muitos aspectos, sim. Eles possuem uma forte formação em estatística e análise quantitativa”, responde Welinton. “No entanto, para se destacar neste campo, ele precisará complementar seus conhecimentos com outros como programação em Python. A combinação destas habilidades permitirá que os economistas utilizem a IA de maneira mais eficaz”.
Comunicação
As habilidades de comunicação também se tornam essenciais para o economista – tanto para se comunicar com as pessoas quanto com as máquinas. “Para dialogar com a IA, precisarão aprender linguagens de programação, pois muitas ferramentas de análise de dados e algoritmos de IA são baseados nelas. Aprender a manipular dados e construir modelos preditivos será uma parte importante do trabalho diário”, observa. “Análise de dados é uma habilidade crucial. Economistas precisarão trabalhar com grandes conjuntos de dados, extraindo insights significativos e aplicando técnicas estatísticas avançadas. Isso inclui o uso de machine learning ou linguagem de máquina para investigar padrões e prever tendências”.
“Outra habilidade importante é a linguagem natural de máquina, que envolve a capacidade de interagir com os sistemas que processam linguagem natural. Isso permitirá que o economista analise dados textuais, como relatórios econômicos ou opiniões de consumidores e extraia informações valiosas”, prossegue o conselheiro do Corecon-SP. “Os economistas devem ser capazes de traduzir estes resultados em recomendações práticas e compreensíveis para formuladores de políticas e partes interessadas, bem como explicar as complexidades da IA e da análise de dados”.
O economista pode atuar na identificação de vieses algorítmicos por meio de uma análise crítica dos dados utilizados na formação dos modelos de IA. É fundamental que os economistas é questionem a qualidade e a representatividade dos dados, além de monitorar os resultados, para garantir que as decisões automatizadas não reproduzam desigualdades.
“A ética e a responsabilidade social devem estar no centro de suas análises. Os vieses algoritmos podem surgir de diversas fontes, como a seleção inadequada de dados, a exclusão de grupos demográficos relevantes ou a interpretação errônea dos resultados”, explica o economista. “Se o modelo de IA for treinado com dados históricos que refletem desigualdades sociais, ele pode perpetuar essas desigualdades em suas previsões e decisões. Portanto, economistas têm a responsabilidade de revisar e auditar os dados usados. Isso não apenas melhora a eficácia das políticas formuladas, mas também fortalece a confiança pública na utilização da IA na tomada de decisões econômicas”.
O economista é muito mais do que um técnico em números ou um especialista em modelos estatísticos. Antes de tudo, ele é um cientista social. Seu papel é compreender como as escolhas individuais e coletivas se articulam com as estruturas econômicas, políticas e culturais, influenciando no desenvolvimento e na geração de riqueza das sociedades.
“A IA pode redefinir o papel social do economista ao permitir uma abordagem mais baseada em evidências para resolver problemas sociais. Com a capacidade de analisar grande volume de dados, os economistas podem se aproximar mais das necessidades reais da sociedade”, aponta Welinton. “Além disso, ela pode ajudar os economistas a entenderem melhor as dinâmicas sociais e econômicas, permitindo uma análise mais aprofundada das causas subjacentes de problemas como desigualdade e exclusão social. Isso pode levar a recomendações mais informadas, que considere não apenas fatores econômicos, mas também sociais e culturais”.
No entanto, o economista alerta para o fato de que essa transformação também pode afastar os economistas das necessidades da sociedade. “A complexidade dos modelos de IA e das análises de dados pode criar uma barreira entre os economistas e a população em geral. É crucial que os eles desenvolvam habilidades de comunicação para traduzir suas descobertas em linguagem compreensiva e relevante para o público”, comenta Welinton. “O papel do economista está em evolução. Aqueles que adotarem a IA de forma ética e responsável e que se comprometerem a se comunicar efetivamente com a sociedade, poderão se tornar agentes de mudança, contribuindo para um futuro mais justo e equitativo”.
Limites éticos
No contexto da rápida transformação tecnológica, a discussão sobre o uso da inteligência artificial na economia não pode se limitar apenas à eficiência, à inovação, aos riscos e às dificuldades. Ela precisa necessariamente incorporar a dimensão ética. Quando algoritmos e sistemas inteligentes passam a influenciar decisões que afetam diretamente a vida das pessoas, a responsabilidade do economista ganha importância ainda maior para assegurar que estas ferramentas sejam utilizadas de forma transparente e justa.
“A transparência aqui é fundamental, pois os modelos de IA podem ser complexos e difíceis de entender. Os economistas devem ser capazes de explicar o funcionamento e os dados utilizados, garantindo que as partes interessadas compreendam a base das decisões tomadas”, comenta. Além disso, a responsabilidade por decisões automatizadas é uma questão crítica. Quando o modelo de IA toma decisões que afetam a vida das pessoas, como a concessão de crédito ou alocação de recursos públicos, é essencial que haja clareza sobre quem é o responsável por estas decisões”.
“Os economistas precisam estabelecer diretrizes claras sobre a responsabilidade ética, especialmente em caso de as decisões possam resultar em discriminação ou exclusão social”, prossegue. “A proteção dos dados pessoais também é uma preocupação central. Os economistas devem garantir que as informações sensíveis sejam tratadas de forma ética e em conformidade com a legislação de proteção de dados, a LPGD”.
“Outro aspecto ético importante é a consideração das implicações sociais de suas análises e recomendações. Os economistas devem estar cientes de que como suas propostas podem impactar diferentes grupos da sociedade, especialmente aqueles que já estão em situações vulneráveis. A tecnologia deve se utilizar a promover o bem-estar coletivo e não para perpetuar desigualdades existentes”, continua Welinton. “A formação contínua em ética e responsabilidade social é crucial para os economistas que trabalham com IA. Eles devem se manter atualizados sobre as melhores práticas e as discussões éticas em torno da tecnologia, garantindo que suas análises e decisões estejam alinhados com fatores éticos sociais”.
Welinton dos Santos
Welinton dos Santos é economista e mestre em gestão pública, com especialização em educação a distância, cidades e psicopedagogia clínica e institucional. Ele também é analista de gestão de riscos e projetos, perito judicial e docente, além de avaliador institucional do Ministério da Educação para cursos universitários.