Podcast Economistas: O mercado de trabalho do economista profissional liberal

Edição desta semana conta com o conselheiro federal Pedro Afonso Gomes, que escreveu uma série de oito artigos sobre o assunto

Está no ar mais um episódio do podcast Economistas e o tema desta semana é o mercado de trabalho e a importância da profissão. O Brasil vive uma expansão na demanda por profissionais de Ciências Econômicas em atividades como regulação, arbitragem, governança corporativa e reorganização empresarial e o conselheiro federal Pedro Afonso Gomes aborda várias destas áreas. Ouça o podcast Economistas na sua plataforma favorita ou no player abaixo.

O episódio desta semana foi gravado no estúdio Economistas, em Brasília. A entrevista foi conduzida pela conselheira federal Fabíola Andréa Leite de Paula e a apresentação foi da coordenadora de Comunicação do Cofecon, Renata Reis.

A chancela do economista

Gomes escreveu uma série de oito artigos intitulada “Mercado de Trabalho para o Economista Profissional Liberal” (acesse AQUI) e o primeiro texto da série foi “A Chancela do Economista, no qual destaca a importância de que os documentos técnicos sejam assinados por profissionais devidamente registrados nos Conselhos Regionais de Economia.

“Eu era presidente do Corecon-SP em 2010 e falava para os conselheiros sobre a importância de nós valorizarmos a legislação que tínhamos sobre os economistas. E o conselheiro mais antigo, que já tinha 70 anos de idade e 50 (ou quase isso) de profissão respondeu que nós não tínhamos as mesmas prerrogativas e favores legais que outras profissões”, conta Gomes. “Eu sempre carregava nas reuniões plenárias o regimento interno e a lei dos economistas. Abri o Decreto 31.794/1952 e li para ele o artigo terceiro, com as atribuições dos economistas; o quarto, que diz que aquelas atribuições só têm validade jurídica se assinadas por economistas; e o sétimo, que diz que, ao assinar estes documentos, ele tem que mencionar o número de registro no Corecon. A partir daí o conselheiro falou: publica um artigo”.

O assunto ficou dando voltas na cabeça de Gomes. “Fiquei pensando: se um conselheiro, um economista com tanto tempo de atuação, professor muitos anos, não sabe das prerrogativas profissionais dos economistas, quem dirá os estudantes”, questionou. “Por isso a importância do economista: para mostrar que temos atribuições na legislação em vigor e que nós devemos valorizar. Além de estudar no curso de Ciências Econômicas, precisamos saber quais são as nossas prerrogativas legais”.

Legislação

Desde a década de 1970 os economistas buscam uma atualização da Lei 1.411/1951. “Estávamos sob a presidência do economista Jamil Zantut, ele encaminhou um projeto para a Câmara dos Deputados e relacionava todas as atividades que, na época, eram exercidas por economistas e que não estão na legislação de 1951”, mencionou Gomes. E abriu um parêntese: “A legislação de 1951 daria assunto para outro podcast, de como o processo foi apertado para que a nossa profissão não tivesse a amplitude que tem”.

O PL em questão passou por três comissões. “Na terceira, o relator era o deputado Tancredo Neves e um representante de outra categoria profissional, deputado e líder do partido político em vigor, acabou conseguindo o arquivamento”, conta o conselheiro federal. “Este projeto teria uma atualidade muito forte, seria mais amplo, mas foi engavetado. Por isso, continuamos buscando esta atualização”.

Atualmente tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 3.178/2024, de autoria dos deputados federais Reginaldo Lopes (PT/MG) e Mauro Benevides Filho (PDT/CE). No dia 03 de dezembro de 2025 o Projeto foi relatado pelo deputado André Figueiredo (PDT/CE) e aprovado pela Comissão de Trabalho. Atualmente tramita na Comissão de Finanças e Tributação e tem como relator o deputado Luiz Carlos Hauly (PODE/PR).

“Na primeira redação, o PL 3.178/2024 criou uma série de problemas com outras profissões. Hoje temos uma redação mais enxuta, mas que vai criar menos dificuldades”, avalia Gomes. “O núcleo duro da nossa profissão está na Lei 1.411/1951, que diz que os campos de atuação do economista são a economia e as finanças. Mas este é um campo muito largo, em que também há atuação de contadores, administradores e possivelmente de advogados e engenheiros. Em conversa com os parlamentares, estamos tentando garantir nosso espaço, as prerrogativas dos economistas e dos Conselhos de Economia. Penso que vamos conseguir”.

Avaliação de empresas

O terceiro artigo da série aborda avaliação econômica de empresas, ativos tangíveis e intangíveis e passivos ocultos. “Sempre ouvimos que os empresários buscam lucro, mas eles não buscam só o lucro, buscam a valorização da sua empresa. Nós mostramos quanto vale a empresa deles, porque às vezes eles não têm ideia”, explica o economista. “Numa discussão familiar ou com os sócios eles ficam perdidos, porque avaliam o patrimônio físico (tangíveis), mas se esquecem que a empresa criou uma marca e que este conceito, por vezes, tem mais valor que os itens materiais”.

Ele cita o exemplo das cinco maiores empresas do mundo. “A Amazon tem muito pouco patrimônio. Tem alguns sistemas, mas isso é pouco perto do que ela vale: o conceito Amazon, o bom desempenho naquilo que faz, este é o valor da empresa”, argumenta Gomes. “A internacionalização da economia faz com que haja investidores fora do País investindo em empresas nacionais. A entrada de recursos para um investimento produtivo vem sendo grande há alguns anos. Eles querem comprar empresas que dão resultado. Empresas que têm valor. E é aí que nós, economistas, fazemos a valoração da empresa”.

A avaliação de empresas também é uma tarefa importante nas sucessões e disputas judiciais. “Aquele que sai tem o direito de receber sua parte na empresa. E que parte é esta? Tem que ser definido tecnicamente. Os herdeiros têm que distribuir as cotas do pai que faleceu. Quem faz esta conta? Numa fusão, aquisição ou incorporação de empresas, quem é que diz quanto cada empresa vale? O economista. Este é um campo de trabalho muito grande para quem tiver condições e estudar para isso”, comenta Gomes.

Perícia econômico-financeira

Um campo de atuação que vem ganhando espaço junto ao Poder Judiciário é a perícia econômico-financeira. “Esta é a minha principal atividade, estou neste campo há 28 anos. A perícia é a atuação de um profissional especializado no fato concreto”, explica o economista. “O que é uma demanda judicial? Uma disputa entre duas partes que tem dúvida sobre duas coisas: o fato econômico e o direito aplicável àquele fato econômico. O perito economista vai analisar os fatos e expor ao juiz, aos advogados – que não são especialistas em economia e finanças – quais são as questões envolvidas naquele caso, de modo que as partes façam um acordo ou que haja uma sentença do juiz a respeito”.

Gomes explicou a necessidade de o perito se especializar em algumas áreas (por exemplo, contratos bancários e comerciais, dissolução de sociedade, avaliação de empresas, indenização, entre outras) para poder dar respostas. E contou um trabalho recente que realizou. “Fiz a avaliação de um estacionamento dentro de um grande edifício, quase um shopping, e ninguém sabia como avaliar. Por quê? Porque quem detinha a administração do estacionamento precisava pagar ao condomínio um valor de aluguel”, contou. “O engenheiro trouxe suas medições e eu, como assistente técnico de uma das partes do condomínio, propus que fosse analisado o potencial econômico do estacionamento, porque quem administra não vai ficar olhando metros quadrados, vai verificar o ingresso de receitas, as despesas e quanto sobra para ele. E o juiz entendeu que o critério era efetivamente econômico”.

“Para isso, eu preciso estudar muito, porque cada caso é um caso”, prossegue Gomes. “Fiz uma lista há algum tempo com cerca de 80 tipos de perícia, e em cada um deles é preciso estudar. No Sindicato dos Economistas de São Paulo nós temos, há 15 anos, um plantão de perícias toda terça-feira: atendemos até quatro pessoas para ajudar os economistas, sejam jovens ou mais antigos, a fazer melhor seu trabalho”.

Os Corecons, na visão do conselheiro federal, são a ponte para aproximar o profissional perito e o Poder Judiciário. “Tenho uma estimativa de que hoje há 10 mil economistas atuando como peritos. Em São Paulo, são quase 40% do total de economistas. E onde ela acontece? Não é nos tribunais superiores, é na base – e a base é o território dos Corecons. Eles devem dar suporte para que seus economistas se tornem peritos, seja do juízo, seja como assistentes técnicos. Sempre preferi ser assistente, mas muitos colegas são peritos do juiz”.

Atuação a partir do código civil

O Código Civil Brasileiro não é apenas um conjunto de normas jurídicas. É também um arcabouço regulatório fundamental para o funcionamento da economia de mercado. A Parte Geral cria os fundamentos da personalidade, direitos patrimoniais e atos jurídicos, enquanto a Parte Especial regula as relações obrigacionais, empresariais, patrimoniais, familiares e sucessórias, sempre com impactos econômicos e financeiros profundos. E o economista tem um papel importante para reduzir custos de litígios e aumentar a eficiência das relações privadas.

“Há algum tempo trabalhei para uma dissolução de sociedade em que um dos sócios havia falecido e outros três estavam vivos. Trabalhei para os três, contra os herdeiros do falecido. Eram três enormes restaurantes em São Paulo, muito bem-conceituados, mas não davam resultado”, relata Gomes. “Fiz eles compreenderem que era melhor acabar com este litígio, desde que todos entendessem o que estava acontecendo naqueles restaurantes, que todos estavam deficitários, e que a proposta não seria fazer uma perícia para dizer o que cada um tem, mas melhorar o desempenho econômico-financeiro do restaurante. E foi o que fiz. Falei: vamos pagar os impostos e as dívidas atrasadas e chegar a um ponto em que saberemos quanto valem os restaurantes, e aí dividimos. Se a divisão ocorrer agora, todos ficarão responsáveis por dívidas. Então ajudei eles desde um ponto de vista da gestão econômica da empresa”.

Consultoria e planejamento estratégico

A demanda por consultores econômicos tem crescido no Brasil. A atividade, anteriormente, era cara e acessível somente para empresas de certo porte. “Comecei exatamente há 25 anos com uma experiência diferente: vender horas de consultoria. Em vez de vender um projeto, eu vendia horas de conversa com o cliente – e praticamente sempre resolvia o problema dele, porque às vezes as coisas não eram tão grandes assim”, conta o economista. “Hoje isso é chamado de mentoria. Você pode fazer a consultoria montando projetos, mas pode também orientar. E os recursos tecnológicos existentes permitem que cheguemos a qualquer lugar. Uma empresa do Acre pode ter o mesmo consultor que uma de São Paulo. Mas você precisa ter um conhecimento ou uma experiência que ajude o cliente. Não adianta falar de consultoria se você não ajudar o cliente a crescer”.

“O campo do planejamento estratégico é um dos melhores para os economistas, mas menos valorizados pelas empresas, então muita gente abandona”, prossegue Gomes. “Planejamento estratégico é partir das condições estabelecidas pelo mercado e fazer algo que planeje a vida da empresa durante um certo tempo e corrigindo dia a dia. Mas se ela não tiver nenhum rumo, nenhum planejamento, sempre vai andar em círculos sem sair do lugar”.

“Um ex-vice-presidente do Cofecon, a quem sempre admirei, Kanitar Aymoré Saboia Cordeiro, dizia que o economista enxerga a flores para depois enxergar a árvore. O economista tem condições de ver todas as áreas”, recordou. “O melhor livro de administração de produção industrial que conheço não é de um engenheiro, é de um economista. Ele ensina como se administra a produção, que teoricamente seria uma questão da engenharia, mas ele o faz sob a ótica econômica. A logística, a parte comercial, o marketing, tudo tem a ver com aquilo que o economista faz”.

ESG

A pauta ESG (que articula responsabilidade ambiental, social e de governança) ampliou significativamente o papel do economista em organizações públicas e privadas. Cada vez mais, as análises econômicas precisam considerar os impactos ambientais e a eficiência no uso de recursos e na mitigação.

“Em 2010 eu convidei um economista para ser entrevistado na revista. Ele era gerente ambiental de uma grande empresa fabricante de pneus. E ele respondeu: olha, do meu departamento depende toda a empresa, porque os clientes perguntam o que é feito da borracha que sobra depois que consumimos o pneu, os resíduos que podem prejudicar o ambiente. Veja, estamos falando de 2010, não de hoje”, ressalta Gomes. “Essa preocupação hoje é muito maior. O economista não pode nunca deixar de ajudar a refletir, do ponto de vista econômico, sobre os danos ambientais”.

“Escrevi um artigo em 2019 falando sobre Brumadinho e as indenizações, e digo, nós temos tudo a ver com a questão ambiental, com o planejamento, e com a questão social, que é a outra letra do ESG. O Artigo 3º do Decreto 31.794 termina mencionando todas as demais atividades que promovam o aumento da riqueza e da renda e a sua distribuição”, pontua Gomes. “Vemos uma sociedade extremamente desigual e o economista tem que pensar assim: eu tenho a responsabilidade de tentar fazer com que ela diminua e que as pessoas sejam consideradas iguais, do ponto de vista da dignidade”.

“Um dos maiores economistas vivos hoje, Amartya Sen, que ganhou o prêmio Nobel, tem vários livros e, num deles, fala a respeito do conceito de pobre. O que é ser pobre? O conceito dele vai da economia e diz que ser pobre é não conseguir desenvolver todas as suas potencialidades, porque a pobreza não é só material, mas tudo aquilo que faz com que você não se desenvolva”, conta o conselheiro federal. “O fato de ter vivido uma vida muito pobre faz com que uma pessoa não consiga mais ter um desenvolvimento intelectual, e isso faz com que ele continue pobre, e isso vem da infância. Então precisamos nos centrar muito nestes três conceitos: social, ambiental e planejamento”.

A conselheira Fabíola de Paula, que conduzia a entrevista, também acrescentou sua experiência a respeito. “Sempre trabalhei com políticas públicas e era questionada, sugerindo que seria necessário um assistente social ou uma profissional de saúde, ou uma psicóloga. Sempre debati com eles que eu poderia desempenhar essa função, porque não se faz política pública sem orçamento”, argumentou Fabíola. “Outro termo que também se usa é a herança da pobreza. Esse pobre tem um filho ou uma filha que não tem acesso a educação, cultura e saúde e vai herdar a situação de pobreza do pai, porque não foi garantido a ele o desenvolvimento das suas potencialidades”.

Reestruturação empresarial

Outro campo com muito espaço para a atuação de economistas é a reestruturação empresarial – algo que vai muito além do corte de custos. “Tenho essa experiência desde quando estava no Banco do Brasil. O Banco às vezes era nomeado síndico de massa falida ou comissário de concordata de processos judiciais de empresas em dificuldades e eu era nomeado auxiliar do comissário. Comecei a virar especialista nisso e acho que já trabalhei na recuperação ou reestruturação de 250 empresas”, comenta o economista. “A empresa não é um hobby. Ser empresário não é para qualquer um. Às vezes o profissional é um ótimo vendedor, ótimo técnico de produção ou administrador financeira, mas ao se ver diante das dificuldades que todas as empresas passam, ele tem problemas e, muitas vezes, se fecha em seu conhecimento, sem buscar pessoas que tenham alternativas”.

Ao falar da sua atuação na área, trouxe novamente a função social do economista. “Sabe por que eu aceitei ser gestor de empresas em recuperação? Principalmente pelas pessoas que ficariam desempregadas. Certa vez, em Ferraz de Vasconcelos, perto de São Paulo, fui chamado pelo dono e ele falou: quero que feche minha empresa, e me pediu para cuidar disso. Eu respondi: sim, mas eu não posso estudar um pouco e ver se não tem recuperação? Em três ou quatro dias, falando com pessoas, pegando uns mapas, vi que havia erros na produção, logística e comercialização que, se corrigidos, fariam a empresa dar lucro”, conta o economista. “Em menos de dois meses ela começou a dar resultado. Mas nos primeiros dias tive que mandar algumas pessoas embora. Peguei a folha de pagamento, vi quem custava mais, eram chefes e questionei se precisava de tudo isso. Onde tinha um encarregado e dois mecânicos, cortei o chefe e deixei os dois mecânicos. Percebi que algumas pessoas não faziam absolutamente nada, cortei. Cortei vendedores. Quando cheguei, havia ali 60 funcionários. Um ano e um mês depois, quando deixei a empresa, deixei com 120 funcionários”.

“Existia no final daquela rua um aglomerado de barracos que eram de pessoas que vieram de outros estados trabalhar nas fábricas daquela rua e adjacências. Anos antes, quando visitei aquela rua como gerente do Banco do Brasil, havia 12 fábricas. Quando voltei, só havia duas – aquela que fui administrar e mais uma. As pessoas do aglomerado não tinham mais emprego. Eu fiz crescer a empresa e as pessoas passaram a ter emprego”, conta o economista. “Até hoje eu trabalho para isso: manter empregos. O pobre só tem a força de trabalho dele, mais nada. Prefiro recuperar uma empresa a inventar outras que nem emprego dão. Eu ganho dinheiro com as empresas que assessoro, mas também tenho um trabalho social por trás”.

Pedro Afonso Gomes

Pedro Afonso Gomes é economista com pós-graduação em Mercado de Capitais, Direito Empresarial e Estratégia Empresarial. Atuou no Banco do Brasil por 15 anos. Foi presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo e coordenador do 2º Encontro Brasileiro de Perícia, Avaliação e Auditoria Econômico-Financeira. Atua como perito, avaliador, auditor, consultor, gestor e negociador e ministra cursos de formação para peritos.

A série de oito artigos sobre o mercado de trabalho do economista pode ser acessada clicando AQUI.

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