Ana Cláudia Arruda alerta para injustiça tributária e privilégios no topo da pirâmide social
“Não podemos deixar de tributar o andar de cima; 10% para quem ganha R$ 50 mil é pouco”, afirmou a conselheira federal em debate na Rádio Jornal, de Recife
A conselheira federal Ana Cláudia Arruda participou nesta quarta-feira (15) do programa Debate da Super Manhã, realizada pela Rádio Jornal, de Recife. O tema do programa foi a tributação e participaram também o professor Eric Castro e Silva, da Universidade Federal de Pernambuco, e o deputado federal Augusto Coutinho.
Reforma tributária
A conselheira federal destacou que discutir a reforma tributária no Brasil significa enfrentar um dos pilares estruturais da desigualdade econômica. “A questão tributária é definidora do processo de desenvolvimento em qualquer país e foi relegada a segundo plano no Brasil. Não tivemos reformas estruturantes capazes de alterar esse perfil da desigualdade”, comentou a economista. “Os países desenvolvidos fizeram suas reformas há 50 anos, não só do ponto de vista tributário, mas fizeram suas reformas urbanas, sociais, educacionais, reformas em vários em várias dimensões. No Brasil nós ficamos com um modelo defasado”.
A conselheira trouxe o dado de que, no Brasil, 75% da carga tributária incide sobre o consumo, enquanto apenas 25% dela incide sobre a renda e a riqueza (contra cerca de 40% nos países ricos). “Quem arca com essa tributação é a classe trabalhadora, que consome tudo o que ganha. As elites dominantes pagam poucos tributos, o Brasil é um dos poucos países que não tributa lucros e dividendos”, aponta. “Esta reforma tributária é um debate importantíssimo para o Brasil. Estamos fazendo justiça social e criando outra lógica para a sustentação e o futuro do País”.
A economista acredita que a reforma não trará uma redução da carga tributária no curto prazo, mas sim no médio. “Uma redução a partir da eficiência fiscal que vai se gerando e da unificação da carga, que hoje é confusa e extremamente complexa, com tributos em cascata”, comentou Ana Cláudia. “O sistema anterior é um Frankenstein que alimenta guerra fiscal e desigualdade. Teremos a isenção para quem ganha até R$ 5 mil, mas ainda estamos distantes de tributar os mais ricos. Uma carga de 10% para quem ganha R$ 600 mil por ano ainda é pouco para a transformação estrutural que precisamos”.
Reforma administrativa
3:41:26 – https://youtu.be/V6GShc9Ujlc?t=13288
Outro tema em discussão durante o debate foi a reforma administrativa. Para Ana Cláudia, o Brasil precisa enfrentar os privilégios concentrados no topo da pirâmide social, tanto no setor privado quanto no setor público. “O debate sobre a reforma administrativa está apenas começando. Eu gostaria de trazer um dado sobre a desigualdade: 55% da população em extrema pobreza no Brasil está na região Nordeste. Nós não conseguimos solucionar isso nos últimos 30 ou 40 anos”, comentou, enquanto o deputado Augusto Coutinho acrescentou que 51% dos benefícios fiscais estão nas regiões Sul e Sudeste do Brasil.
“Aliada a esta questão existe outro quadro que é uma pequena elite de servidores públicos da cúpula dos três poderes que é uma versão contemporânea de uma casta patrimonialista que remonta à era colonial. Pessoas que estão atrás de remunerações e penduricalhos, se apropriando de recursos públicos ao mesmo tempo que dizem pensar na população”, prosseguiu Ana Cláudia. “Não questionamos o mérito da entrada, que são os concursos mais disputados do país. Mas esta elite é resistente, corporativista, e a sociedade está inerte. Não é possível que tenhamos aposentadorias de R$ 50 mil”.
Amparando-se nas análises de Thomas Piketty, ela afirmou que políticas sociais isoladas não são suficientes para reduzir desigualdade quando o topo continua se apropriando da maior fatia da renda nacional. “Em 2015, Piketty começou a falar sobre desigualdade. Até então achávamos que as políticas sociais eram suficientes porque o índice de Gini estava melhorando no Brasil, mas depois que se abriram os dados da Receita Federal e vimos esta elite dos três poderes se apropriando da riqueza do País foi que nos demos conta de que era preciso trazer esta discussão para a sociedade”, argumentou. “Temos o que eu costumo chamar de Estado aristocrático de bem-estar social para estes grupos dominantes”, finalizou a economista.