XXVI CBE: A economia diante da crise climática
Economistas defenderam que a transição para uma economia ecológica é urgente — e que o Brasil pode ser protagonista na construção de soluções sustentáveis e inclusivas
A crise climática deixou de ser uma ameaça distante para se tornar um dos principais vetores de transformação econômica e social do século XXI. O tema esteve no centro do painel “Meio Ambiente-Economia Ecológica”, realizado durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), em Porto Alegre. O debate reuniu economistas de diferentes regiões do país: Tania Cristina Teixeira, presidenta do Cofecon; Wallace Pereira, conselheiro do Corecon-MG e professor da Universidade do Pará; Michele Lins Aracaty e Silva, presidente do Corecon AM/RR; e Marcus Eduardo de Oliveira, delegado regional do Corecon-SP — sob a mediação da conselheira federal Mônica Beraldo.
Ao abrir o painel, a presidenta Tania Teixeira contextualizou a urgência do debate ambiental e destacou o papel ativo do Cofecon, por meio da Comissão de Sustentabilidade Econômica e Ambiental. Para a economista, “durante muito tempo essa questão foi colocada como um problema a ser resolvido no futuro, mas esse futuro já chegou”. Ela lembrou que desde a ECO-92 a ciência econômica foi desafiada a incorporar limites ecológicos do crescimento, dando origem a novas abordagens como a economia ecológica, a contabilidade verde e a precificação do carbono.
Tania traçou uma linha histórica da evolução das políticas climáticas — de Kyoto a Paris — e relacionou os marcos globais aos impactos cada vez mais severos dos desastres ambientais no Brasil. Citou as enchentes em Porto Alegre e a seca recorde na Amazônia como exemplos de “um país confrontado com os extremos da crise climática”. A presidenta do Cofecon defendeu que “é preciso superar a visão de que preservar custa caro”, argumentando que a transição para energias limpas e a economia circular podem gerar empregos e aumentar a competitividade. “Temos a escolha de ficar presos ao passado lamentando, ou assumir o protagonismo e nos reinventar”, concluiu, chamando os economistas a pensar políticas públicas que integrem crédito socioambiental e cofinanciamento de iniciativas sustentáveis.
Infraestrutura e transporte como eixos da transição verde
O professor Wallace Pereira trouxe uma análise técnica sobre a relação entre emissões de gases de efeito estufa, ocupação territorial e infraestrutura. Com base em dados recentes, destacou que “a região Norte, especialmente os estados do Pará e do Mato Grosso, se destacam como os maiores emissores devido à mudança no uso da terra e da floresta”. Segundo ele, o padrão de desenvolvimento herdado do período militar — centrado na expansão rodoviária — ainda molda a estrutura produtiva e o perfil das emissões brasileiras.
Para o economista, a mudança desse paradigma é uma das maiores oportunidades para o país. “O transporte ferroviário e a cabotagem podem ser estratégicos não apenas para reduzir emissões, mas também para melhorar a produtividade e a competitividade da economia nacional”, argumentou. Wallace defendeu que a reorganização dos modais de transporte deve estar no centro de uma nova política de desenvolvimento sustentável, capaz de combinar ganhos econômicos e ambientais. Em sua visão, “infraestrutura é política ambiental e econômica ao mesmo tempo”. Ele também alertou para o desempenho negativo do Brasil nas exportações de produtos verdes, reforçando a necessidade de agregar valor à biodiversidade e promover “sofisticação produtiva com base na inteligência ecológica”.
Amazônia no centro das soluções climáticas
Representando o Corecon AM/RR, Michele Lins Aracaty e Silva trouxe a perspectiva amazônica ao debate, destacando que “as mudanças climáticas já fazem parte da nossa realidade” e atingem de forma mais dura as populações vulneráveis. Relatando sua experiência direta na região, ela lembrou que “a Amazônia ficou sem água nos últimos dois anos, algo que parecia impensável”. A economista enfatizou que a crise climática agrava desigualdades e exige políticas que aliem mitigação e justiça social.
Michele defendeu que o Brasil precisa ser visto “não como um problema, mas como celeiro de soluções”. Para ela, as oportunidades estão na bioeconomia, nas energias renováveis e na geração de empregos verdes. A economista destacou ainda a importância de fortalecer o financiamento climático e criar infraestrutura mais resiliente, especialmente nas cidades amazônicas. Com a COP30 marcada para novembro de 2025, em Belém, Michele vê uma chance histórica de o país liderar uma agenda global de justiça climática. “O Brasil tem a chance de mostrar ao mundo que é possível crescer preservando”, concluiu.
Repensar a economia para preservar a vida
Encerrando o painel, o economista Marcus Eduardo de Oliveira reforçou a dimensão ética e civilizatória do desafio ambiental. Ele destacou que o modelo econômico atual está em desequilíbrio com os limites planetários e precisa ser repensado. “A economia não é uma ciência do lucro, é uma ciência da sobrevivência”, afirmou. Segundo ele, é fundamental compreender que a sustentabilidade não é apenas uma variável, mas o próprio eixo de sustentação da vida econômica.
Marcus defendeu uma “nova racionalidade econômica”, na qual o progresso seja medido não pelo PIB, mas pelo bem-estar e pela preservação ambiental. “O planeta não precisa de mais crescimento; precisa de regeneração”, disse. Ele propôs que a economia ecológica sirva de base para uma mudança estrutural no modo de produzir e consumir, integrando valores humanos e ambientais às decisões macroeconômicas. “Quando o meio ambiente entra em colapso, a economia também entra”, alertou.
XXVI Congresso Brasileiro de Economia
O Congresso Brasileiro de Economia ocorreu de 06 a 10 de outubro no Plaza São Rafael Hotel, em Porto Alegre, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Reconstrução, Desafios e Oportunidades”. O evento reuniu cerca de 50 especialistas e 500 participantes (online e presencial) em torno de grandes temas que impactam o futuro do país, como reforma tributária, mudanças climáticas, comércio internacional, agronegócio, desigualdades regionais, inovação, economia comportamental, educação financeira e o papel do Estado na neoindustrialização. A promoção foi do Cofecon, em parceria com o Corecon/RS.
O evento contou com o patrocínio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Vero/Banrisul, Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), Monte Bravo Investimentos, Conselhos Regionais de Economia de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Paraná e Rio de Janeiro.