III Seminário Mulher Economista e Diversidade: saiba como foi a noite de abertura
Palestra magna teve como tema “Violência de gênero e os impactos na economia” e esteve a cargo das economistas Luciana Servo e Marilane Oliveira Teixeira
A cidade de Salvador recebeu na noite de 04 de setembro a abertura do III Seminário Nacional da Mulher Economista e Diversidade, no auditório do Sebrae Bahia. O evento teve como tema “Violência de Gênero e Economia: Impactos e Saídas Possíveis pelas Vias da Empregabilidade e do Empreendedorismo” e reuniu economistas, autoridades, estudantes e pesquisadoras. Confira as fotos do evento clicando AQUI ou pela galeria abaixo:


A mesa de abertura teve a presença da presidenta do Cofecon, Tania Cristina Teixeira; da Coordenadora-Geral de Garantia de Direitos das Mulheres no Trabalho, Maria Angélica Rodrigues da Costa; da presidenta do Coreco-BA, Isabel Ribeiro; e a participação remota da coordenadora da Comissão da Mulher Economista e Diversidade do Cofecon, Teresinha de Jesus Ferreira da Silva.
Mesa de abertura
Ao falar as palavras de abertura, Tania destacou que o seminário é um espaço de reflexão e fortalecimento da presença feminina na profissão. “Ao conectar economia e gênero, evidenciamos que esta não é uma pauta meramente social ou moral. Este é um tema profundamente ligado ao desenvolvimento e à justiça econômica”, comentou. “O diálogo com a economia feminista amplia a nossa compreensão sobre as estruturas que perpetuam desigualdades e nos oferece novas lentes para discutir e construir soluções mais inclusivas. Nesse sentido, o empreendedorismo aparece como um caminho de empoderamento, permitindo que mulheres enfrentem as barreiras impostas pelo mercado de trabalho tradicional e possam gerar renda, autonomia e transformação social”.
Mas não se trata de qualquer tipo de empreendedorismo – porque, muitas vezes, isso significa uma ocupação informal, marcada pela ausência de proteção social. “O que buscamos destacar é a necessidade de políticas públicas e instrumentos de apoio que transformem o empreendedorismo feminino numa via real de emancipação e não apenas em uma estratégia de sobrevivência. Isso inclui acesso a crédito em condições justas, e aqui eu abro um parêntese para trazer um dado”, observou Tania Teixeira. “Uma pesquisa do Sebrae divulgada no ano passado, com base nas operações de crédito realizadas no primeiro trimestre do ano, mostrou que a taxa de juros que as empreendedoras pagam é quase quatro pontos percentuais maior do que aquela que os empreendedores homens: 36,8% contra 40,6% ao ano”.
A presidenta do Cofecon também agradeceu aos homens presentes ao evento. “Este não é um debate exclusivo das mulheres e não prescindimos dos homens, porque as consequências desta discussão que aqui faremos transbordam para toda a sociedade. Ao melhorarmos as condições de vida e de trabalho para as mulheres, por meio de políticas que tragam uma inserção econômica mais justa, todos saem ganhando”, finalizou.
A conselheira federal Teresinha de Jesus Ferreira da Silva, coordenadora da Comissão Mulher Economista e Diversidade do Cofecon, enviou uma saudação em vídeo. “Vamos discutir os impactos da violência de gênero na economia. Este é um tema oportuno quando analisamos os indicadores relativos à violência contra a mulher no Brasil, que ainda são assustadores”, pontuou. “Nós, mulheres economistas, precisamos refletir e dar maior visibilidade ao tema e, principalmente, analisar os impactos da violência na economia brasileira. Mesmo com as leis mais avançadas, a violência de gênero ainda persiste. Este é um fenômeno que continua sendo marcado pelo silêncio”.
A presidenta do Corecon-BA, Isabel Ribeiro, fez um agradecimento a todas as pessoas que contribuíram para a realização do evento e a todas as palestrantes, expositoras e mediadoras. “Vocês são a alma deste encontro”, mencionou a economista. “Também agradeço às pessoas que serão agraciadas com menção honrosa, por sua atuação incansável na defesa do direito das mulheres e no combate à violência de gênero. Que este reconhecimento seja um símbolo da nossa admiração e incentivo à continuidade desta luta”.
Maria Angélica Rodrigues da Costa, Coordenadora-Geral de Garantia de Direitos das Mulheres no Trabalho, falou do trabalho no Ministério das Mulheres. “Nossa secretaria tem a missão de propor políticas públicas que promovam autonomia econômica, que incentivem a inclusão de mulheres em postos de emprego nos diversos setores da economia”, contou. “Mas só propor a inclusão não é suficiente. Para a mulher estar nestes postos, muitas outras coisas precisam ser consideradas. A sociedade impôs muitas barreiras. Queremos não apenas a inclusão, mas as condições para a permanência.
Luciana Servo: Outros tipos de violência agravam o quadro
A palestra magna teve como tema “Violência de gênero e os impactos na economia” e contou com duas palestrantes: a presidenta do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Luciana Servo; e a professora e pesquisadora Marilane Oliveira Teixeira.
Luciana Servo trouxe uma reflexão contundente sobre os desafios enfrentados pelas mulheres no Brasil. Ela destacou o avanço da presença feminina em espaços de liderança nos Conselhos de Economia, mas lembrou que ainda há barreiras estruturais a serem superadas. “O que a gente está discutindo aqui, em termos econômicos, é um grande sistema de reprodução social de todas as desigualdades. Enquanto não mudarmos esse sistema de reprodução social da violência, os números que eu trouxe aqui continuarão se repetindo”, afirmou.
Servo apresentou dados alarmantes do Atlas da Violência, elaborado pelo IPEA em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Entre 2013 e 2023, mais de 47 mil mulheres foram assassinadas no Brasil, sendo que 35% dessas mortes ocorreram dentro da residência. “Apesar de uma pequena redução na taxa geral de homicídios, os feminicídios não caíram. Desse total, 35% deles acontecem na residência. A probabilidade de uma mulher negra ser assassinada é 70% maior do que a de uma mulher branca. Os números têm cor, território e região”, alertou.
Além da violência letal, a economista destacou a gravidade das agressões psicológicas, que muitas vezes passam despercebidas. Segundo pesquisa recente do Fórum, 37,5% das mulheres relataram ter sofrido algum tipo de violência nos últimos 12 meses. “Ainda que a violência fatal nos assuste, os outros tipos de violência agravam todo o quadro ao longo dos anos. Muitas mulheres não reconhecem a humilhação ou o insulto como violência, e isso contribui para sua reprodução”, explicou.
Para Luciana Servo, combater a violência e a desigualdade exige mudanças estruturais e políticas públicas consistentes. Ela também chamou atenção para os custos econômicos da violência, estimados em mais de 2% do PIB, e para a necessidade de enfrentar o “apagamento da memória” de mulheres e negros ao longo da história. “Não existe desenvolvimento possível enquanto tivermos discriminação de qualquer natureza e esses índices de violência. Não existe democracia possível diante dessa taxa de letalidade para determinados grupos populacionais”, concluiu.
Marilane Teixeira: “Falta de políticas públicas empurra mulheres para a invisibilidade”
Marilane Oliveira Teixeira trouxe uma análise das raízes estruturais da violência e das desigualdades de gênero no Brasil. Para ela, não se trata de problemas individuais ou circunstanciais, mas de um sistema de relações patriarcais. “Nós não queremos essa sociedade. Queremos enfrentar a violência e a desigualdade, mas precisamos pensar em outro modelo, porque este não dá conta de responder a esses problemas fundamentais”, afirmou. “Existe um processo de legitimação de formas de violência que foram sendo naturalizadas, reforçadas e fortalecidas”.
A economista destacou que a autonomia econômica das mulheres é central para romper o ciclo da violência. Sem condições de renda, milhões permanecem presas em relações abusivas e desiguais. “Sair do círculo de violência depende fundamentalmente da capacidade das mulheres de ter autonomia econômica. E isso exige políticas públicas consistentes, não orçamentos irrisórios”, alertou, ao criticar os recursos insuficientes destinados às políticas para mulheres.