Deliberações do Seminário: “Até Quando? Estrutura Tributária Regressiva + R$ 1 trilhão para os Juros da Dívida Pública!”
Seminário realizado na Câmara dos Deputados (Auditório Freitas Nobre) em 21/05/2025
O mercado financeiro não pode se sobrepor à nação brasileira! Os mais ricos não podem continuar isentos de pagar impostos!
Senhor Presidente da República, senhores parlamentares, senhores presidente e diretores do BC, senhores dirigentes partidários,
O Brasil padece há anos de dois graves problemas: uma carga tributária absurdamente regressiva e gastos excessivos com o pagamento de juros da dívida pública. Tais problemas, além de travarem um maior crescimento da economia brasileira, concorrem de forma acentuada para concentrar ainda mais a renda e a riqueza nas mãos de um reduzido grupo de privilegiados.
O Fórum Nacional pela Redução da Desigualdade Social no Brasil e suas organizações constitutivas vêm apelar para que o Congresso Nacional, o Governo Federal e o Banco Central do Brasil, em prol do pleno desenvolvimento econômico e social do País, tomem as medidas necessárias para superar, de uma vez por todas, essas duas barreiras.
Leia AQUI o documento síntese.
1. Em relação à regressividade tributária: que a 2ª fase da Reforma Tributária institua a justiça tributária no Brasil.
O Brasil é um dos países que tem uma das estruturas tributárias das mais regressivas do planeta, ou seja, os que têm baixos rendimentos pagam relativamente mais tributos do que os que têm rendimentos elevados. A 1ª fase da Reforma Tributária realizada pelo Congresso Nacional foi concluída com sucesso, apontando para a simplificação e racionalização da estrutura tributária brasileira. Agora é a hora de se avançar na 2ª fase, instituindo a justiça tributária em nosso país, mediante as seguintes medidas:
a) Instituição da tributação sobre lucros e dividendos da pessoa física. O Brasil é o único país relevante do planeta que não tributa a distribuição de lucros e dividendos para a pessoa física. Estudo de economista do IPEA revela que, em 2024, tais ganhos somaram nada menos que R$ 998 bilhões, com isenção de 100%. Isso é inaceitável. Bastaria a instituição de alíquotas escalonadas entre 10% e 20% para serem arrecadados cerca de R$ 150 bilhões. (Alguns projetos de lei caminham nessa direção, como os PLs 1.087/2025 e 1.981/2019).
b) Alterar a tabela de cobrança de Imposto de Renda na fonte. Tal medida começaria por aumentar o valor da faixa inicial de contribuição para pouco mais de 3 SM (R$ 5.000,00), elevar substantivamente os pisos de tributação das faixas seguintes (de 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%) e fixar uma 5ª faixa, de 35%, para rendimentos mensais acima de R$ 40.000,00, aplicando atualização monetária anual para evitar confisco. (Há proposições legislativas que caminham neste sentido, como os PLs 1.087/2025 e 3.089/2008).
c) Instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas. A soma do patrimônio de todos os brasileiros oscila entre 4 e 5 vezes nosso PIB, algo em torno de 48 a 60 trilhões de reais. Os mais ricos detêm cerca de 70% deste montante. Um tributo anual de 0,5% sobre essas fortunas resultaria numa arrecadação em torno de R$ 180 bilhões de reais por ano. (Neste sentido, há o PLP 9/2019 e há vários anos se encontra pronto para a pauta no Plenário da Câmara o PLP 277/2008).
Resultado: o aumento da arrecadação de tributos advindos daqueles que efetivamente podem pagar resultaria numa maior capacidade de investimento do Estado, na redução dos tributos sobre as classes trabalhadoras e média e também numa redução da tributação incidente sobre as empresas, aumentando sua competitividade.
2. Em relação aos gastos com juros da dívida pública: Que a política monetária atenda aos interesses da Nação, e não do mercado financeiro
Em sua última reunião, o Copom elevou mais uma vez a taxa Selic, agora para 14,75%. Observamos que a política anterior do ex-presidente Roberto Campos Neto, tão corretamente criticada pelo presidente Lula, vem sendo mantida e até intensificada, evidenciando que a propalada “autonomia” do BC tem sido usada para submetê-lo aos interesses do mercado financeiro, que recorre a argumentos falaciosos que precisam ser desmistificados:
a) a inflação não está fora de controle. O BC e a grande mídia falam em “estouro da meta de inflação”, mas não há nenhum sintoma de explosão inflacionária no horizonte. O acumulado de 12 meses até maio está em 5,32%, apenas 0,82 ponto percentual acima da banda superior da meta de inflação. Mas já em janeiro, com o IPCA de 2024 fechando em 4,83% (pífio 0,33 ponto percentual acima da banda superior), o mercado financeiro alardeava um suposto estouro da meta e pressionava pelo aumento da Taxa Selic. O sistema de metas de inflação é uma armadilha montada pelos economistas neoliberais para colocar o governo nas mãos do mercado financeiro. Como este deseja uma taxa de juros real elevada, pressiona para que seja fixada uma meta de inflação excessivamente baixa que, não atingida, justificaria uma elevação dos juros. Por 14 anos, entre 2005 e 2018, a meta de inflação no Brasil foi de 4,5% ao ano, com teto oscilando entre 6,0% e 6,5%, e apenas em 2015, ano de grave crise econômica, o teto foi “furado”. Entretanto, a partir de 2019, por pressão do mercado financeiro, a meta foi sendo reduzida ano a ano, até chegar a 3% em 2024, com teto de 4,5%. Mas, surpreendentemente, o Governo Federal (Ministérios da Fazenda e do Planejamento), em junho de 2024, manteve a meta em 3%, quando poderia retorná-la ao nível de 2019, bem mais factível para a realidade brasileira. Resultado: em três dos últimos seis anos o teto foi “furado”.
b) O déficit primário não é a causa da explosão da dívida pública. O mercado financeiro exige do governo federal a geração de um robusto superávit primário, com a falsa narrativa de que o governo gasta demais. Diz que o anunciado corte de gastos de R$ 70 bilhões foi insuficiente. E não bastaram as novas regras de correção do salário mínimo e de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e do Abono Salarial, que sacrificam os mais pobres. O mercado quer mais, inclusive o fim dos pisos constitucionais para saúde e educação. O mercado diz que o déficit primário está fora de controle e faz disparar a dívida pública. Grande mentira! O que faz a dívida do setor público “explodir” não é o déficit primário, mas o gasto com juros da dívida pública, de inacreditáveis R$ 988 bilhões em 2024 (sem contar a rolagem da dívida, de outro trilhão), vinte e uma vezes maior que o déficit primário de R$ 47 bilhões. É ele o grande responsável pelo aumento da relação dívida/PIB.
c) O hiato entre PIB real e PIB potencial é uma falácia. Os economistas neoliberais, manipulando grosseiramente o conceito de “PIB potencial”, afirmam que o país não pode crescer acima de 4% ao ano, tese também aceita pelos tecnocratas do BC, conforme seu comunicado de 11/12/2024: “A atividade econômica e o mercado de trabalho seguem apresentando dinamismo, com destaque para o PIB do terceiro trimestre, que indicou abertura adicional do hiato. Um crescimento acima do esperado, o que exige uma política monetária ainda mais contracionista”, qual seja, aumento da taxa de juros para reduzir o crescimento. Sob o falso argumento de que a economia está crescendo além dos seus limites, fomentando a inflação, o comunicado do BC alerta para os riscos trazidos pelo “dinâmico crescimento da economia e do emprego”. Seus tecnocratas conseguem transformar uma boa notícia – o crescimento de 4% do PIB no 3º trimestre de 2024 e a forte geração de empregos, com mais pessoas tendo dinheiro para consumir – num problema.
d) A Dívida Pública no Brasil não tem servido para financiar investimentos sociais. Os expositores do Seminário mostraram dados do Banco Central e do Tribunal de Contas da União comprobatórios de que a chamada dívida pública no Brasil não tem servido para financiar investimentos sociais, mas sim para pagar os próprios juros e outros mecanismos financeiros que promovem uma enorme transferência de recursos ao pagamento de juros e amortizações dessa dívida, consumindo mais de 40% do orçamento federal. Esse funcionamento do endividamento público às avessas tem sido denominado de Sistema da Dívida, pois subtrai recursos continuamente, em vez de aportar e viabilizar investimentos. O principal responsável pelo crescimento exponencial do estoque da dívida interna federal é a elevada taxa de juros praticada no país. A Selic a 14,75% ao ano corresponde a uma taxa básica real de 8,95%, inflando os gastos com juros e comprometendo toda a economia. Enquanto isso, os EUA praticam 2,15%, a Zona do Euro pratica 0,2% e o Japão -2,99% (negativos). As justificativas do BC para uma Selic tão elevada são altamente questionáveis, dado que a inflação brasileira decorre principalmente de fatores que não guardam relação com uma suposta demanda aquecida, como preços de alimentos (devido à priorização das exportações, à falta de estoques reguladores, dentre outros fatores) e preços administrados pelo próprio governo (combustíveis, energia e outros), que não caem com a alta de juros.
Consequências. O brutal aumento da taxa de juros ocorre num momento em que o país gerou 3,1 milhões de empregos com carteira assinada em 2023/24 e em que alcançou a menor taxa de desemprego desde 2012 (6,6%). E todos sabem quais são as consequências da elevação da Selic: encarecimento do crédito às empresas e redução do investimento produtivo; encarecimento do crédito às pessoas, resultando na redução do consumo e no agravamento do endividamento das famílias; aumento dos gastos com juros da dívida pública e, consequentemente, aumento da dívida pública; queda na geração de empregos e redução do crescimento do PIB. E quem são os principais favorecidos pela decisão do BC? O clube vip do 1% mais rico, grupo com rendimento familiar anual superior a R$ 1 milhão, grande parte provenientes de juros auferidos com aplicações financeiras, além de dividendos recebidos e não tributados.
O que está em curso é um movimento comandado pelo mercado financeiro pelo desmonte do Estado e de seus instrumentos de promoção do crescimento econômico e de proteção social e a adoção de uma agenda econômica liberal. A disseminação de mentiras, como um suposto “estouro da meta de inflação”, somado ao suposto “descontrole nos gastos públicos” e a um “excessivo crescimento do PIB”, geram a falsa narrativa do mercado financeiro e da grande mídia de que a economia do País vai mal, versão diametralmente oposta à realidade concretas: pelo quarto ano consecutivo o PIB crescerá acima de 3%; a taxa de desemprego está caindo; a inflação está sob controle; não há colapso fiscal algum; as contas externas estão equilibradas; e as reservas internacionais são da ordem de US$ 370 bilhões. Os reais problemas do País são o R$ 1 trilhão gasto com os juros da dívida pública; a não tributação de R$ 1 trilhão de lucros e dividendos distribuídos; e os R$ 500 bilhões de isenções fiscais. Sobre isso, o mercado e a grande mídia se calam.
Para alterar tal quadro, algumas medidas se impõem:
a) Auditoria da Dívida Pública (com participação social) e alteração da política monetária, por Comissão Mista do Congresso Nacional, conforme artigo 26 do ADCT, ou via Decreto Presidencial, tendo como objetivos, por exemplo: apurar a legitimidade dessa dívida pública que não tem cumprido a sua função de financiar o desenvolvimento socioeconômico; quais os fatores responsáveis por seu crescimento; quem tem se beneficiado desse processo; quais as medidas a serem tomadas;
b) Impulsionamento da Frente Parlamentar sobre o Limite de Juros e Auditoria Integral da Dívida Pública com Participação Popular, lutando pela aprovação do PLP 104/2022, que limita a taxa de juros aplicada em todos os tipos de empréstimos e financiamentos e acaba com a injustificada remuneração diária da sobra de caixa dos bancos (remuneração paga diariamente aos bancos sobre um dinheiro que sequer pertence a eles, realizada pelo BC por meio do abuso das Operações Compromissadas e dos Depósitos Voluntários Remunerados), tendo em vista que enquanto os bancos contarem com essa remuneração garantida pelo BC, não se interessarão em financiar pessoas e empresas a juros baixos;
c) Revogação do Decreto Presidencial 12.079/2024, que dispõe sobre o regime de “metas de inflação”, o qual tornou tal regime (vigente desde 1999) ainda mais prejudicial ao país, na medida em que ampliou a possibilidade de o Banco Central justificar taxas de juros absurdas sob a desculpa de “combate à inflação”. O combate à inflação deve ser feito por meio do enfrentamento de suas verdadeiras causas, com medidas como: priorizar a agricultura familiar, realizar a reforma agrária, formar estoques reguladores de alimentos, reduzir os preços administrados pelo governo (como combustíveis e energia);
d) Revogação do “arcabouço fiscal” (Lei Complementar 200/2023), que manteve o teto de gastos sociais criado pelo governo Michel Temer (EC-95), admitindo apenas um crescimento real anual de no máximo 2,5%, e mantendo sem limite algum os gastos com juros e amortizações da chamada dívida pública;
e) Outras propostas: controles sobre os fluxos de capitais especulativos; combate à PEC 65/2023 (que transforma o Banco Central em empresa); ampla conscientização e mobilização da população sobre os temas tratados no Seminário.
Resultado: Estas medidas se traduziriam na rápida queda das taxas de juros, com o aumento no investimento público e privado, aumento nos investimentos sociais, crescimento econômico, geração de empregos, aumento da renda e grande redução na desigualdade social, dado que atualmente é uma pequena elite rentista super-rica quem mais se beneficia dos juros altos.
Dessa forma, as organizações integrantes do Fórum Nacional pela Redução da Desigualdade Social exortam a sociedade brasileira, as centrais sindicais, as organizações sociais, as entidades empresariais da indústria, da construção civil e do comércio e todas as organizações democráticas da sociedade brasileira a exigirem que o Banco Central do Brasil reduza a taxa Selic, assim como conclamam os partidos políticos e seus parlamentares a darem o passo necessário na Reforma Tributária, dando fim às descabidas isenções concedidas aos elevados rendimentos e ao imenso patrimônio dos mais ricos, fazendo-os efetivamente pagarem impostos.
Assista AQUI o evento na íntegra ou pelo player abaixo: