Paulo Dantas da Costa: “Estado tem responsabilidade com as camadas sociais mais baixas” 

Em seminário na Câmara sobre arcabouço fiscal e pacote de corte de gastos, presidente criticou alta dos juros e argumentou que direitos sociais devem ser pagos sem cortes

A Câmara dos Deputados recebeu nesta quinta-feira (12) o seminário “O Novo Arcabouço Fiscal e o pacote de cortes de gastos: impactos na saúde, educação, seguridade social e direitos trabalhistas”, a fim de discutir as medidas anunciadas pelo governo. O evento teve a participação do presidente do Cofecon, Paulo Dantas da Costa, e dos conselheiros regionais José Luiz Pagnussat (Corecon-DF) e André Paiva Ramos (Corecon-SP) na mesa de abertura, e pode ser assistido pelo canal da Câmara dos Deputados no YouTube clicando AQUI.

“Estamos abordando uma questão de Estado, e este Estado tem uma responsabilidade muito grande para com as pessoas que estão nos patamares sociais mais baixos”, comentou o presidente. “Há camadas que são privilegiadas, como é o caso dos rentistas, credores em última instância da brutal dívida pública, e as despesas com estes membros da sociedade são quitadas sem nenhuma discussão. Não se discute o que pagamos de juros”.

“Recentemente começamos a discutir questões relacionadas com os programas sociais. Não tenho nenhuma dúvida em expressar que isso é indiscutível. Pague-se. Nossa sociedade é deformada, há pessoas que passam por dificuldades extremas. Vamos discutir pagamentos colocando um grau de preferência entre as pessoas?”, questionou Dantas. “Não me constrange repetir: pague-se. É um dever da sociedade que deve ser cumprido pelo poder executivo federal”.

O economista José Luiz Pagnussat, ex-presidente do Cofecon, representou o Corecon-DF na mesa de abertura do seminário. “O que dá importância a este evento é o esclarecimento para a sociedade do que significa o teto estabelecido, porque ainda se mantém um teto. O ajuste que está sendo promovido corta o que é essencial para a sociedade e reduz recursos onde já há poucos”, observou Pagnussat. “A mídia se preocupa com os interesses do sistema financeiro. Eventos como este trazem dados e informações que ajudam a melhorar o entendimento do que significa um pacote como este”.

“Os direitos não estão sendo atendidos de forma adequada. O ajuste propõe restrições específicas para o Benefício de Prestação Continuada, que é um direito de quem não tem capacidade de gerar sua renda e vem de uma família pobre. Está na Constituição, é obrigatório”, criticou Pagnussat. “Não vemos ninguém falar sobre a canetada do Banco Central ontem: o aumento de um ponto percentual na taxa de juros significa um aumento de gastos da ordem de 90 bilhões de reais, e o pacote de corte de gastos é de 70 bilhões. Não se vê na sociedade este tipo de alerta”.

O conselheiro regional André Paiva Ramos, do Corecon-SP, afirmou que é importante que este debate seja feito com diferentes setores da sociedade e não apenas entre especialistas ou agentes do mercado financeiro. “Quando foi divulgado o novo arcabouço fiscal realizamos um evento importante no ano passado, com vários especialistas e inclusive representantes do governo, apontando as inconsistências que ele tinha”, recordou o economista. “Este governo teve uma oportunidade única de repensar as regras fiscais a partir da inviabilidade do teto de gastos, garantir direitos e um regime sustentável, buscando um ajuste de médio e longo prazo para equalizar a dinâmica da dívida pública. Em vez disso, foi apresentada uma regra muito complexa, com inconsistências em sua formulação, que coloca em risco a credibilidade fiscal e ameaça direitos e financiamento em áreas importantes, deixando um clima de incerteza”.

O governo, apontou Paiva Ramos, vendeu à sociedade um ajuste pelo lado das receitas. “Já naquele seminário (realizado pelo Cofecon no ano passado) apontamos as limitações desse ajuste e defendemos que não era necessário um arcabouço fiscal rígido para baixar estruturalmente os juros, que são o principal componente que impulsiona a dinâmica do nosso endividamento. Mesmo participando conosco, o governo pouco nos ouviu”, lamentou o economista. “Este pacote anunciado não é suficiente para retomar a credibilidade. O câmbio foi a R$ 6, os juros subiram 1 ponto percentual e isso impulsiona a dívida pública e o financiamento de áreas importantes como a saúde e a educação está em risco”.

A deputada Sâmia Bonfim, autora do requerimento que originou o seminário, manifestou que se posicionou contra a aprovação do arcabouço fiscal. “Nós já dávamos este alerta: que ele significaria ou a revisão dos pisos constitucionais da saúde e da educação, ou o estrangulamento do investimento em outras áreas sociais, porque é uma questão matemática”, argumentou Sâmia. “Não se trata de uma pressão do mercado ou uma escolha política: esta se deu na época da aprovação do arcabouço fiscal. Agora ela é a concretude daquilo que já vem se arrastando por um ano e meio, mas há alternativas para o modelo vigente”.

“Assim que o pacote foi anunciado, nós apresentamos um PLP para que as regras voltem a ser aquelas anteriores ao governo Temer. As pessoas dizem que não é um debate fácil, porque há uma suposta unanimidade. Mas é necessário realiza-lo, para que a população saiba o detalhe do que significa alterar a política de valorização do salário mínimo e o corte no Benefício de Prestação Continuada”, prosseguiu a deputada. “Uma parte da população não tem oportunidade de entrar no mercado formal de trabalho, ter um mínimo de renda, e depende destes benefícios para sobreviver. As escolhas técnicas econômicas são guiadas por uma visão política, uma visão de mundo: uma sociedade justa, fraterna e igualitária e o Estado como agente indutor para combater as desigualdades e garantir um mínimo de acesso e inclusão para a população mais pobre”.

Share this Post