Gabriel Galípolo, novo presidente do Banco Central
Economista alia formação sólida a uma atuação em várias áreas da profissão, como a docência, a consultoria e os setores público e privado, e inicia seu mandato num momento bastante desafiador
Desde o dia 1º de janeiro de 2025 o economista Gabriel Galípolo é o novo presidente do Banco Central. Ele terá um mandato de quatro anos à frente da instituição e sua chegada ao cargo traz expectativas quanto à condução da política monetária nos próximos anos e à relação com o governo. Além disso, o ano de 2025 traz uma mudança no sistema de metas de inflação. Anteriormente, era levado em consideração o ano-calendário (os 12 meses de janeiro a dezembro); a partir deste ano, a meta se refere à inflação acumulada nos 12 meses anteriores (em novembro, este indicador encontra-se em 4,87%). Ela será considerada descumprida se permanecer, por seis meses consecutivos, acima da margem de tolerância. O Banco Central, em seu site, destaca que este modelo está “em linha com a experiência nacional” e que evita a caracterização de descumprimento em situações de variação temporária (como um choque nos preços de alimentos).
“Ele foi nosso aluno na PUCSP, na graduação e no mestrado. Depois se tornou nosso colega professor na mesma universidade, tendo atuado por 5 ou 6 anos na função. Como aluno, se destacava não apenas pelo interesse e dedicação, como também pelo desempenho, que ia além da sala de aula, em palestras, grupos de estudos, publicações e outras atividades. Como jovem professor também se diferenciava pelo conhecimento e didática, tendo sido reconhecido pelos colegas e pelos alunos”, recorda Lacerda.
Galípolo é graduado em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade de São Paulo e cursou o mestrado em Economia Política na mesma instituição. Ali foi aluno de um ex-presidente do Cofecon, Antonio Corrêa de Lacerda. “Ele foi nosso aluno na PUCSP, na graduação e no mestrado. Depois se tornou nosso colega professor na mesma universidade, tendo atuado por 5 ou 6 anos na função. Como aluno, se destacava não apenas pelo interesse e dedicação, como também pelo desempenho, que ia além da sala de aula, em palestras, grupos de estudos, publicações e outras atividades. Como jovem professor também se diferenciava pelo conhecimento e didática, tendo sido reconhecido pelos colegas e pelos alunos”, recorda Lacerda. “A formação e experiência docente lhe deu as bases para um desempenho profissional de excelência, no setor público, em consultoria no setor privado e como executivo no mercado financeiro, tendo atingido o posto de CEO de banco de investimentos”.
“Vejo que a principal vantagem da nova gestão do BCB é, dada a sua formação e experiência, não ter vínculos com dogmas e paradigmas. Isso cria espaço para mais ativismo na política cambial, de forma a evitar a excessiva volatilidade (instabilidade) da taxa de câmbio”, prossegue Lacerda. “Tão relevante quanto a desvalorização cambial, a volatilidade prejudica as decisões dos agentes econômicos, não apenas quanto às exportações e importações, mas também à produção doméstica e projetos de investimentos. O BCB tem instrumentos para atuar tanto no mercado à vista, quanto futuro para inibir movimentos especulativos e a instabilidade”.
Opiniões do novo presidente
Duas semanas após sua primeira reunião como integrante do Copom, Galípolo participou de um debate promovido pelo Cofecon, em agosto de 2023, e mencionou o processo de decisão dentro do colegiado. Na ocasião, ele falou que as decisões econômicas do governo Lula tinham espírito democrático e que haviam sido calibradas em nome de um esforço coletivo e também elogiou o corpo técnico do Banco Central. “A quantidade de informações trazida por eles facilita muito o processo de decisão”, comentou o economista. Duas semanas antes, a Selic havia sido reduzida em 0,5 ponto percentual e a decisão foi dividida (5 votos pela redução de 0,5 contra 4 votos pela redução de 0,25). Galípolo apontou que as divergências ocorridas foram de ordem técnica e que as duas posições eram totalmente defensáveis.
Em agosto de 2024 o presidente Luiz Inácio Lula da Silva formalizou sua indicação para a presidência do Banco Central. A sabatina no Senado ocorreu em outubro. Na ocasião, o economista argumentou que o Banco Central não deveria votar para definir a meta de inflação e que esta responsabilidade deveria caber exclusivamente ao Conselho Monetário Nacional.
A volatilidade cambial ocorrida após a eleição norte-americana fez com que o dólar, que em outubro estava cotado a R$ 5,40, superasse a casa de R$ 6, atingindo um pico de R$ 6,30. Na ocasião, Campos Neto foi criticado por não intervir no mercado – algo que ocorria com mais frequência durante o governo anterior. Galípolo afirmou que o Banco Central só intervém no mercado cambial em casos de disfuncionalidade, indicando que não haveria grandes mudanças na política cambial sob a sua gestão. Ele também afirmou que a autarquia dispõe dos instrumentos necessários para cumprir a meta de inflação e que o presidente Lula confia no BC para esta tarefa.
Tajetória
A trajetória de Galípolo combina vários campos diferentes de atuação do profissional economista. Ele lecionou durante seis anos na mesma instituição, sendo professor do curso de graduação em Ciências Econômicas, e também atuou como docente no MBA de PPPs e Concessões da Fundação Escola de Sociologia Política de São Paulo (FESP/SP). Além da docência, atuou no setor público nas esferas estadual e federal, tornando-se secretário-executivo do Ministério da Fazenda em 2023 e diretor do Banco Central do Brasil no mesmo ano; no setor financeiro, presidiu o Banco Fator; e como consultor, esteve à frente da Galípolo Consultoria.
“Ele é um exemplo de formação robusta e compromisso com o avanço da teoria econômica, além de se destacar pela atuação diversificada nos mais variados setores. Sua trajetória e contribuição mostram que ele é um economista qualificado nos campos teórico e prático para enfrentar os desafios exigidos pela função de presidente do Banco Central”, expressou o conselheiro federal Antonio Corrêa de Lacerda, professor de Galípolo na PUC/SP, quando o economista foi indicado pelo presidente Lula para a presidência do Banco Central.
Entre 2007 e 2008 ele teve sua primeira experiência no setor público, chefiando a assessoria econômica da Secretaria dos Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo e atuando como diretor da Unidade de Estruturação de Projetos de Concessão e PPPs da Secretaria de Economia e Planejamento do estado de São Paulo.
“Ele é um exemplo de formação robusta e compromisso com o avanço da teoria econômica, além de se destacar pela atuação diversificada nos mais variados setores. Sua trajetória e contribuição mostram que ele é um economista qualificado nos campos teórico e prático para enfrentar os desafios exigidos pela função de presidente do Banco Central”, expressou o conselheiro federal Antonio Corrêa de Lacerda
A experiência adquirida nesta área foi importante para sua atuação no setor privado. O Banco Fator, do qual foi presidente entre 2017 e 2021, tem tradição em programas de privatização e Parcerias Público-Privadas (PPPs). Neste período, o banco atuou no processo de desestatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae). O desenvolvimento de um modelo de parceria público-privada para a empresa começou em 2018 pelo consórcio liderado pelo Banco Fator junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A proposta da PPP buscou atrair bancos privados para modernizar a infraestrutura e expandir a cobertura dos serviços de saneamento básico. O processo foi concluído em 2021.
No ano de 2009 criou a Galípolo Consultoria, da qual foi sócio-diretor até 2022, sendo responsável pela coordenação e estruturação de projetos e estudos de viabilidade econômico-financeira. Sua atuação se deu principalmente no setor de infraestrutura e os estudos realizados representaram, somados, um montante superior a R$ 200 bilhões.
Galípolo também é autor de três livros, em parceria com o professor Luiz Gonzaga Belluzzo: “Manda quem pode, obedece quem tem prejuízo” (2017), “A escassez na abundância capitalista” (2019) e “Dinheiro: o poder da abstração real” (2021).
Em 2023 ele foi reconhecido pelo Cofecon com o prêmio Personalidade Econômica do Ano, tendo sido o economista mais jovem a receber tal distinção. A decisão é tomada por um colegiado composto por 18 conselheiros, entre uma lista composta por três nomes, e obrigatoriamente formando maioria.
Questões de fundo: autonomia do BC e metas de inflação
Uma das principais questões de fundo no início do mandato de Gabriel Galípolo tem a ver com a autonomia do Banco Central. Ela foi estabelecida pela Lei Complementar 179, de 14 de fevereiro de 2021, que determinou também a duração dos mandatos dos diretores e do presidente da autarquia. Por esta razão, Campos Neto – nomeado pelo presidente anterior – continuou na presidência da autarquia até o final de 2024, recebendo críticas constantes do presidente da República.
A inflação de 2023 foi de 4,62% – acima da banda superior da meta, que é de 3% com margem de 1,5% para mais ou para menos. Em 2024, até o mês de novembro (a divulgação do resultado de dezembro acontecerá no dia 10/01), o acumulado de 12 meses indicava 4,87%. Embora esteja acima da meta oficial atual, o número não é incompatível com a meta que vigorou entre 2005 e 2018 (4,5%, com margem de dois pontos até 2016 e 1,5 ponto até 2018). Daí o fato de muitos economistas argumentarem que, embora esteja acima da meta, a inflação não está fora de controle.
“O cenário internacional é desafiador, não apenas pelas questões econômicas, mas também com as geopolíticas que se intercalam. É um quadro complexo, que exige muito conhecimento interpretativo e ações de relevância. Internamente o quadro de pressão inflacionária e elevação ‘contratada’ da taxa de juros também vai exigir um esforço de ‘sintonia fina’ na política monetária para, sem sobressaltos, impor uma nova dinâmica sinalizando primeiro uma estabilidade das taxas de juros, seguida de quedas para níveis que se aproximem da média dos países em desenvolvimento”, avalia Lacerda.
Outro argumento defendido por conselheiros do Cofecon ao longo de 2023 e 2024 foi que a política fiscal não deve estar dissociada da política monetária. No momento em que se executa uma política fiscal fomentadora da atividade econômica, uma política monetária mais restritiva como a praticada pelo BC sob a presidência de Campos Neto minimizaria seus efeitos. E esta dissociação estaria acontecendo usando, como argumento, a autonomia do Banco Central.
Sob este argumento, parte do mercado financeiro defende que uma política monetária menos rígida alinhada com uma política fiscal expansionista estaria mais sujeita a decisões políticas do que técnicas. Esta crítica já ocorreu anteriormente durante o governo de Dilma Roussef, quando o Copom, na gestão Alexandre Tombini, reduziu os juros para 7,25% entre 2012 e 2013 (e mais tarde, em 2015, elevou para 14,25% num momento em que o país vivia uma crise econômica).
Nos últimos meses de 2024 o governo Lula aprovou um pacote de corte de gastos. Segundo o Ministério da Fazenda, ele terá um efeito de R$ 69,8 bilhões em 2025 e 2026, a fim de equilibrar as contas públicas. A meta fiscal para 2025 é zero (nem superavit nem déficit), com margem de 0,25% do PIB para mais ou para menos. Os críticos do Banco Central argumentam que apenas a última elevação da taxa de juros praticada sob a gestão de Campos Neto (de 11,25% para 12,25%) traz ao orçamento de 2025 um impacto, na direção contrária, maior do que o trazido pelo corte de gastos.
“O cenário internacional é desafiador, não apenas pelas questões econômicas, mas também com as geopolíticas que se intercalam. É um quadro complexo, que exige muito conhecimento interpretativo e ações de relevância. Internamente o quadro de pressão inflacionária e elevação ‘contratada’ da taxa de juros também vai exigir um esforço de ‘sintonia fina’ na política monetária para, sem sobressaltos, impor uma nova dinâmica sinalizando primeiro uma estabilidade das taxas de juros, seguida de quedas para níveis que se aproximem da média dos países em desenvolvimento”, avalia Lacerda. “Por outro lado, é preciso considerar que os resultados serão de médio prazo, pois o espaço para mudanças bruscas é limitadíssimo e não recomendável”.
Devido às fortes críticas do presidente Lula à gestão anterior, existe uma expectativa sobre como será a condução da política monetária sob a nova gestão. Na posse de Galípolo como presidente do BC, Lula afirmou que o governo não interferirá na nova gestão, ressaltando a autonomia da instituição.
Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, concedeu uma entrevista no dia 07/01 à GloboNews, e expressou sua confiança no economista. “O Banco Central tem um apanhado de informações, ele dialoga com a sociedade, só que na hora da decisão tem um colegiado de nove pessoas que se reúnem, fecham as portas e tomam uma decisão autônoma. Isso não vai mudar com Gabriel Galípolo e eu tenho a absoluta confiança de que ele sabe qual a missão do Banco Central”.
A sincronia e harmonia das políticas macroeconômicas, fiscal, monetária e cambial, aponta Lacerda, são fundamentais para garantir um ambiente mais favorável às decisões dos agentes econômicos e para viabilizar a execução dos grandes projetos estruturantes como o Nova Industria Brasil (NIB), o Plano de Transição Ecológica (PTE), o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e seus derivados. “Isso não se confunde com autonomia do BCB, que é autônomo para executar a política econômica do governo e não como algo dele desvinculado. Portanto, não há contradição à vista”.