No XXIII CBE, debate abordou desigualdades econômicas e sociais

Um dos destaques na programação do XXIII Congresso Brasileiro de Economia foi o debate sobre distribuição de renda, desigualdade social e diminuição da pobreza. O assunto foi discutido pelos economistas Dominik Hartmann, Claudio Salvadori Dedecca e Fernando Mattos, no dia 18 de outubro, com transmissão ao vivo pelo Facebook do Cofecon. Clique aqui para acessar o vídeo.

Dominik Hartmann iniciou as apresentações. “Ao longo do tempo houve muitas teorias sobre o que causa a desigualdade de renda. Alguns fatores são qualitativos e, portanto, difíceis de medir”, apontou Hartmann. Ele comparou dois países – Malásia e Chile – para abordar um aspecto muito importante no combate à desigualdade: a complexidade econômica. “Uma economia complexa precisa de muita mão-de-obra qualificada. Precisa de instituições que permitam a interação, criando a competitividade”.

Hartmann vê uma relação entre complexidade econômica e desigualdade. Produtos primários, como cacau, petróleo ou soja, tendem a ser exportados por países com mais desigualdade. Produtos mais complexos, como químicos ou automóveis, tendem a ser produzidos por países menos desiguais. Como exemplo, o economista falou da Malásia, muito dependente do petróleo nos anos 70, mas que reduziu o índice de Gini conforme foi diversificando sua economia; e da Noruega, país que tinha uma economia mais equilibrada e que, conforme foi se tornando mais dependente do petróleo, teve um aumento no índice de desigualdade.

Ao falar do Brasil, Hartmann apontou para as grandes diferenças regionais. “A maioria do que o Brasil exporta está na periferia. Há setores avançados, mas exporta muitos produtos simples e importa os mais complexos, que geram melhores empregos fora do Brasil. Agricultura e mineração sempre serão importantes, mas não suficientes para lutar contra a desigualdade. Além disso, o país é muito grande, com desigualdades regionais. Hoje se discute se é preciso mais gastos sociais ou mais liberalização na economia, mas o problema é mais complexo. Definir o que fazer e onde fazer, porque cada região tem suas próprias necessidades e gargalos. No país ainda falta muita interação entre a ciência e o setor produtivo”.

Claudio Dedecca, professor do Instituto de Economia da Unicamp, foi o seguinte a falar. “No país é impraticável qualquer avaliação que não aponte para um aumento da desigualdade nos próximos anos. Os dados já começam a apontar isso”, afirmou o economista. “Tivemos um crescimento recente, lastreado no que o país já tinha. A redução da desigualdade depende do crescimento e a experiência brasileira mostrou isso. Nossa redução da desigualdade foi apoiada no consumo”.

Dedecca usou constantemente o termo desigualdades, no plural. Caracterizou desigualdades econômicas e sociais: “Hoje não há desigualdade significativa em termos de mortalidade infantil no Brasil. Mas temos desigualdade de renda corrente, aquela que cada um de nós recebe cada mês, e principalmente em termos de renda do patrimônio. Se eu pegar a média da PNAD, jamais venderia um Land Rover no Brasil. A renda que permite a venda de um bem como este não é a corrente”.

Ao fazer comparações com outros países, Dedecca falou da Suécia. “O país conheceu um aumento na desigualdade da renda corrente, mas reduziu significativamente a desigualdade social. O Estado proporciona um conjunto de bens que dão qualidade de vida e melhoram o meio ambiente, o que é melhor do que receber a renda diretamente”, argumentou. “A Holanda tinha a renda do petróleo e investiu pesadamente em mobilidade e transporte. O que é morar na Holanda hoje? Não precisar de carro. Se tivéssemos feito isso na década passada, não estaríamos hoje importando ônibus elétricos”.

E como reduzir a desigualdade no Brasil? “Não virá do mercado de trabalho. Precisamos de um padrão de investimentos que ataque as carências e deficiências sociais que a população brasileira sofre. Saneamento, habitação, transporte e mobilidade. É na dimensão social que você tem a possibilidade de reduzir de forma significativa as desigualdades no país. O pré-sal deveria ser investido nisso e não na simples redução do déficit fiscal”.

Fernando de Mattos iniciou falando que a parcela 1% mais rica da população brasileira detém 28% da renda nacional. Caracterizou o período de 2004 a 2014 como de crescimento expressivo da renda e do emprego. “Mas vejam só que coincidência”, ironizou. “A partir do momento em que há a intensificação da crise política, a desigualdade começa a subir, tanto a da renda total quanto a da renda do trabalho, e tudo indica que continuará subindo”.

Mattos apresentou muitos dados  para falar sobre a desigualdade e também ironizou o uso da palavra reforma. “Reforma é uma palavra que a esquerda usava muito nos anos 60, e que os neoliberais nos roubaram, e que agora significa uma retirada de direitos”. Também falou que muitos economistas desejam que o salário mínimo seja retirado. “Nós defendemos que não seja, até por uma questão referencial”.

Ao falar especificamente dos empregos, disse que “nos anos 90 parecia que a situação do emprego nunca iria melhorar, piorava constantemente. Depois melhorou, e agora estamos indo no caminho de uma década perdida”, apontou. “Montou-se um discurso absurdo no Brasil de que as leis trabalhistas geram desemprego. Com as mesmas leis, no governo Lula, foram criados milhões de novos empregos. No Rio de Janeiro, após a reforma, muito do que está sendo criado é apenas trabalho intermitente”.

O vídeo das palestras pode ser acessado na página do Cofecon no facebook. O Cofecon também atua no combate à desigualdade no país, sendo coordenador do Fórum Nacional pela Redução da Desigualdade Social e promovendo uma campanha nacional.