“Juros altos travam a economia há bastante tempo”, afirma Aquino

Economista é integrante da Comissão de Política Econômica do Cofecon. Ele fez críticas ao tripé macroeconômico e falou sobre inflação, dólar, juros e reforma tributária

O economista Fernando de Aquino Fonseca Neto, integrante da Comissão de Política Econômica do Cofecon, foi entrevistado nesta segunda-feira (12) no programa Faixa Livre, que vai ao ar pelo Youtube. Ele falou sobre a inflação de julho, a taxa básica de juros, a cotação do dólar e os impactos do novo arcabouço fiscal sobre os gastos do governo. A entrevista pode ser assistida clicando AQUI.

A inflação de junho foi o primeiro tema em discussão. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo, divulgado naquele dia, foi de 0,38 no mês, totalizando 4,5% em 12 meses – no limite da meta de inflação. “São números aceitáveis. Os principais itens que impactaram o índice foram as passagens aéreas e os combustíveis derivados de petróleo. Dentro dessa perspectiva, não há nada de tão impressionante”, observou Aquino. “O que desperta cuidado é o comportamento dos preços dos serviços. A inflação de serviços está descolada da inflação média, e é mais difícil de ter políticas localizadas ou setoriais. Com preços de bens é mais fácil atacar diretamente no mercado”.

“A inflação está pressionada não só pela demanda aquecida, mas também por um câmbio bastante depreciado. A alta dos juros trava a economia. Se o combate à inflação tiver apenas esta ferramenta, não se possibilita que a economia cresça”, pontuou Aquino.

O economista apontou que há indícios de uma pressão de demanda – e que, no curto prazo, ela precisa ser controlada. “A mídia corporativa e os economistas do mercado financeiro dizem que é preciso subir a taxa de juros. O problema é que o Brasil tem idolatrado a política do tripé macroeconômico (metas de inflação, câmbio flutuante e superavit primário), na qual a única ferramenta de controle da inflação é a alta dos juros”, pontuou Aquino. “A inflação está pressionada não só pela demanda aquecida, mas também por um câmbio bastante depreciado. A alta dos juros trava a economia. Se o combate à inflação tiver apenas esta ferramenta, não se possibilita que a economia cresça”.

O problema, diz o economista, é que já faz bastante tempo que a economia do Brasil cresce pouco. “De 1996 a 2023, o crescimento do PIB real per capita médio é de 1,2% ao ano, contra quase o dobro do crescimento mundial”. “Somos uma economia de renda média, com vários problemas de distribuição, que precisa crescer o PIB, mas em vez de nos aproximarmos da média mundial, estamos nos distanciando. E o grande responsável é esse nível de taxa Selic. A qualquer soluço da inflação se propõe subir uma taxa que tem sido muito alta”.

A cotação do dólar teve uma oscilação muito forte nas últimas semanas, passando de R$ 5,43 no dia 16 de julho para R$ 5,75 no dia 1º de agosto e retornando a R$ 5,51 na véspera da entrevista. “Há um risco de termos saída de capitais – ou, às vezes, ela não acontece, mas o câmbio aumenta esperando essa fuga. Parte das pessoas vendem posições em países emergentes e compram dólar para aplicar em títulos norte-americanos”, comentou o economista. “Isso tem impacto inflacionário forte. Precisamos importar trigo, então impacta o preço do pão. A carne sobe, porque os preços de exportação são maiores e o produtor quer ter no mercado interno o mesmo retorno que tem com a exportação”.

Aquino defendeu que o Banco Central atue diretamente no mercado de dólar. “Há uma ferramenta, o swap cambial, que atua no mercado futuro afetando o mercado à vista, mas é muito criticado porque não faz parte do tripé macroeconômico”, observou.

“O governo acreditou que conseguiria ter um programa de gastos assistenciais, que são necessários, e investimento em infraestrutura, tributando as maiores rendas. Mas temos um Congresso extremamente conservador”, afirmou Aquino.

O economista também caracterizou o novo arcabouço fiscal como uma aposta que não tem dado certo. A norma substituiu o antigo teto de gastos. “Ele foi feito para flexibilizar e possibilitar um aumento de gastos com o aumento da arrecadação e a tributação sobre as maiores rendas. Do ponto de vista da justiça social e do crescimento, seria tudo de bom – mas é preciso combinar com os ‘russos’. As pessoas que têm privilégios e pagam menos impostos não vão querer pagar mais”, afirmou Aquino. “O governo acreditou que conseguiria ter um programa de gastos assistenciais, que são necessários, e investimento em infraestrutura, tributando as maiores rendas. Mas temos um Congresso extremamente conservador”.

Ele mencionou que o imposto de renda sobre lucros e dividendos e o Imposto Territorial Rural são ferramentas com grande potencial arrecadatório, mas que no Brasil têm pouco ou nenhum uso. “Há também o caso dos profissionais liberais. Quem trabalha numa empresa é tributado pela tabela do imposto de renda. Alguns profissionais têm CNPJ, mas funcionam como pessoa física. É uma renda do trabalho, e não de uma combinação de pessoas trabalhando ou de uma empresa com folha de pagamento. Essas pessoas pagam menos impostos do que seus colegas. É algo que precisa ser ajustado, mas é mais uma pauta que não avança”.