Podcast Economistas: Saiba mais sobre o Prêmio Nobel de Economia

Nome do laureado de 2024 será anunciado no dia 14/10. Conheça a importância e a trajetória desta premiação que é a mais importante do mundo nas ciências econômicas

Está no ar o episódio nº 133 do podcast Economistas! No dia 14 de outubro será realizado o anúncio do nome escolhido para receber o Prêmio Nobel de Economia de 2024, e o podcast desta semana aborda um pouco do histórico desta premiação, que é a mais importante do mundo na área das ciências econômicas. Ele pode ser ouvido na sua plataforma preferida ou no player abaixo:

Quem conversou sobre o assunto foi o economista Felipe Almeida, professor do Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da Universidade Federal do Paraná. Suas principais áreas de atuação são economia institucional e história do pensamento econômico. Ele é também divulgador científico e um dos membros do podcast Economia Underground. Esta edição é fruto de uma parceria entre o Conselho Federal de Economia e a Universidade Estadual de Campinas, a Unicamp.

O Nobel e o prêmio de economia

O Prêmio Nobel foi criado pelo engenheiro e químico sueco Alfred Nobel, que registrou mais de 300 patentes e ganhou muito dinheiro com a invenção da dinamite. “Ele faleceu no final do século XIX e deixou o desejo de que parte do seu espólio fosse designado para a criação de um fundo que concederia prêmios para contribuições notáveis para a humanidade”, comenta Almeida. “Neste pedido ele designou cinco categorias: medicina, física, química, literatura e paz. O prêmio na área de economia não vem do desejo de Alfred Nobel”.

Em 1968, por ocasião da comemoração de 300 anos do Banco Central da Suécia (Sverige Riksbank), foi criado o Prêmio do Banco Central da Suécia para as Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel. Como não fazia parte do testamento, ele não é oficialmente um Prêmio Nobel, mas seu processo de indicação e de escolha dos ganhadores guarda muita semelhança com os demais prêmios e ele é informalmente conhecido como o Nobel de Economia.  Existem, no entanto, duas diferenças principais: o anúncio não é feito na mesma semana dos demais prêmios (conhecida como Semana Nobel), mas na segunda-feira seguinte; e o prêmio não é pago com dinheiro da Fundação Nobel, mas com dinheiro público.

O prêmio foi entregue pela primeira vez no ano de 1969. Naquele ano, foi dividido entre o norueguês Ragnar Frisch e o holandês Jam Timbergen por terem desenvolvido e aplicado modelos dinâmicos para a análise dos processos econômicos.

“No final da década de 1960 a economia estava passando por um momento conhecido como alta teoria. As contribuições econômicas eram mais axiomáticas e abstratas”, explica Felipe. “Mas ele começava a dar passo para outro período, da economia como ciência empírica, que começa na década de 1970 e se torna um elemento muito forte hoje. Ela parte de hipóteses abstratas, predefinidas, e começa a haver uma elaboração dessas hipóteses para analisar os chamados fenômenos econômicos”.

Durante mais de cinco décadas o prêmio contemplou ganhadores de diferentes correntes, como Milton Friedman, Paul Krugman, Friedrich Hayek e Joseph Stiglitz. No entanto, o professor aponta que, embora haja uma pluralidade de temas, não se pode dizer o mesmo em relação às metodologias. “É uma pluralidade relativa, porque há variedade de temas, mas girando em torno do que é conhecido como o mainstream da economia e deixa de lado abordagens alternativas”, argumenta o professor da UFPR. “No Brasil a diversidade é maior, porque existe também há perspectivas alternativas, normalmente chamadas de abordagens heterodoxas. Temos discussões identificadas com o pós-keynesianismo, o desenvolvimentismo, o neoschumpeterianismo e com o movimento institucionalista”.

Interação com outros campos

Em algumas ocasiões o Prêmio Nobel de Economia foi concedido a profissionais que não eram economistas. É o caso dos matemáticos Lloyd Shapley e John Nash e do psicólogo Daniel Kahneman. A interação entre a ciência econômica com outros campos do saber abre novos campos de estudos que começam a ganhar mais importância ao serem reconhecidos dentro da premiação.

“O grande requisito é fazer uma contribuição para a ciência econômica. Ele não precisa atuar na área, mas se sua contribuição for absorvida pela economia e gerar um impacto, pode ser que ele venha a ser laureado”, pontua Felipe. “Às vezes se brinca dizendo que um premiado pode inclusive nem entender por que é que ganhou o Nobel de Economia”.

O próprio Shapley, ao receber a notícia da escolha de seu nome, disse que nunca havia sido economista. Nash, cuja história é contada no filme Uma Mente Brilhante, trouxe contribuições para a área de teoria dos jogos. “É um campo da matemática que foi abraçado pela ciência econômica. Hoje é comum lecionarmos este conteúdo nos cursos de economia, porque tem a ver com o estudo de interações estratégicas entre indivíduos e grupos de indivíduos”, constata Almeida. “Nash não foi um sujeito que se debruçou sobre a ciência econômica – foi a ciência econômica que se debruçou sobre os estudos e a abordagem dele”.

Já o psicólogo Daniel Kahneman, falecido em 2024, começou a lidar com a tomada de decisões econômicas. “A economia e a psicologia têm se aproximado bastante de diversas formas. Kahneman trouxe insights psicológicos para a análise econômica. Ele pegou elementos muito bem estabelecidos na economia e questionou: será que é assim mesmo que a decisão é tomada?”, contou o professor. “Ele fazia muitos experimentos e desafiou grandes postulados econômicos. A partir desta abordagem experimentalista ele começou a oferecer uma contribuição teórica para a tomada de decisão na economia”.

O trabalho de Kahneman foi importante para que o campo de estudos da economia comportamental ganhasse importância. Este conhecimento permite olhar para outros períodos da história econômica brasileira e tentar compreender como se dava a tomada de decisões naquele momento.

“Como é que nós lidávamos com a hiperinflação enquanto consumidores, com a moeda desvalorizando toda hora? Como nós interpretávamos isso?”, questiona Felipe, indicando um uso prático para as ferramentas trazidas pela economia comportamental. “Hoje usamos muito as mídias sociais e elas geram um viés de reforço, porque tendemos a seguir pessoas com quem compartilhamos algumas coisas, às vezes até a nossa visão de mundo. Isso pode distorcer a tomada de decisão, por estarmos interagindo muito com pessoas que têm uma perspectiva muito similar à nossa”.

“Existem possibilidades, contemporâneas ou mais antigas, em que a economia comportamental pode dar respostas”, continua o professor. “Podemos formatar estudos comportamentalistas para analisar a nossa realidade. Isso demanda menos infraestrutura laboratorial de pesquisa. Mas quando precisamos formatar um experimento específico e gerar um ambiente experimental, aí temos alguns gargalos científicos para lidar com esta questão”.

Mulheres na ciência econômica

Durante quarenta anos o Prêmio Nobel de Economia foi concedido exclusivamente a homens. Esta situação ocorreu até o ano de 2009, quando Elinor Ostrom tornou-se a primeira mulher a ser laureada. Dez anos depois, a economista Esther Duflo também foi contemplada com o prêmio. Apesar dos avanços recentes, a ciência econômica ainda é vista como um campo majoritariamente masculino.

“Não só a ciência econômica, mas todas as ciências, assim como todas as instituições existentes no Brasil, deveriam representar quem nós somos, o que é a nossa nação, e não apenas um extrato”, afirmou Felipe. “No Brasil ela ainda é muito masculina, muito branca, muito hétero e deixa de lado o que compreendemos como minorias sociais. Não deveria ser assim, porque nossa nação não é assim. Cada espaço deveria refletir quem nós somos. Esta questão só vai ser superada com a abertura de espaços”.

Almeida pontua que não haverá desenvolvimento econômico de fato se as oportunidades não foram iguais. “Só teremos resolvido o problema quando este debate não fizer mais sentido. Uma parte muito expressiva da nossa nação não ocupa espaços fundamentais, como é o caso da ciência”, argumenta. “O espaço científico e universitário precisa ser ocupado por mais mulheres. Elas são a maior parte da população. A democracia demanda representatividade”.

O Prêmio Nobel de Economia de 2023 foi entregue para a norte-americana Claudia Goldin, reconhecendo seus estudos sobre as mulheres no mercado de trabalho. Ela observou que os empregos que recompensam os funcionários sempre disponíveis são um dos maiores causadores da desigualdade de gênero no trabalho. Além disso, as mulheres são mais afetadas alguns anos após terem o primeiro filho. O desenvolvimento econômico também não significou uma maior participação feminina na força de trabalho nos últimos 200 anos.

“O Brasil tem dado uma boa resposta em relação aos estudos de gênero. Há um grupo de estudos conhecido como GeFam, que trata de gênero e família na economia e recentemente realizou seu quinto congresso. Há estudos nacionais com as mesmas preocupações de Claudia Goldin”, aponta o professor. “Eles lidam com diferenças de salários, de oportunidades, e são diagnósticos muito claros. Precisamos trabalhar em cima destas comprovações científicas para que isso não continue acontecendo. Penso que os pesquisadores brasileiros têm dado, sim, respostas a contento”.

Economia para a paz

O Prêmio Nobel de Economia conferiu visibilidade ao trabalho de diversos economistas por suas contribuições a esta ciência, tanto na forma teórica quanto aplicada. Todos os anos um ou mais economistas são agraciados com esta premiação.

Em 2006, no entanto, ocorreu uma situação diferente: um economista, utilizando os instrumentos dados pela ciência econômica, teve o seu trabalho reconhecido – mas com uma premiação diferente: o Prêmio Nobel da Paz. O bengali Muhammad Yunus e o Grameen Bank foram laureados por promover oportunidades econômicas e sociais para os mais pobres, especialmente as mulheres, com seu trabalho pioneiro de microcrédito.

“Ele fundou o Grameen Bank a fim de promover o microcrédito para as pessoas menos abastadas. Falamos anteriormente de gênero e grande parte dos empréstimos deste banco são associados à população feminina”, comentou Almeida. “Ele rompeu um paradigma da ciência econômica: dizia-se que o pobre tem mais tendência a ser inadimplente porque tem menos recursos para honrar seus compromissos. A inadimplência do Grameen Bank é muito baixa. Essa experiência provou empiricamente que é possível prover crédito e uma distribuição intertemporal da renda para estas pessoas”.

No Brasil, quem mereceria o Nobel?

O Brasil ainda não possui um ganhador do Prêmio Nobel. Se pudéssemos mencionar alguns economistas do presente ou do passado (muito embora o Nobel não atribua prêmios póstumos) que, em algum momento, mereceriam ganhar, quem seriam? E quais são as contribuições da ciência econômica brasileira que poderiam ser reconhecidas internacionalmente?

“Com certeza os nomes dos professores Celso Furtado e Maria da Conceição Tavares vêm a cabeça. Foram figuras ímpares na ciência nacional. Mas para que um brasileiro venha a ganhar o Nobel, é muito importante que esteja inserido nos grandes debates ao redor do mundo e, devido ao próprio processo de indicação, que esta ciência seja reconhecida por seus pares em nível internacional”, observa Felipe Almeida. “Temos professores que estão gerando pesquisa de alta qualidade, publicada em revistas internacionais. Mas por vezes estão realizando trabalhos hercúleos, porque precisamos de estrutura para a produção científica. Sem infraestrutura de pesquisa, teremos muita dificuldade de manter esta inserção”.