Podcast Economistas: Como alcançar a justiça social num país tão desigual?

Economista Flávia Vinhaes abordou temas que vão desde a garantia de renda até a oferta de serviços públicos, passando pelo combate à pobreza intergeracional

Quando falamos de justiça social, pensamos em um sistema que garanta igualdade de oportunidade para todos. Mas para que haja esta garantia, é preciso também que sejam garantidos alguns direitos. Quer saber como isso funciona? Está no ar a edição número 117 do podcast Economistas, com a economista Flávia Vinhaes, doutora pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, e ela pode ser ouvida na sua plataforma preferida ou pelo player abaixo.

Vivemos em um país cuja economia é reconhecida por ser uma das mais desiguais do mundo. Como é possível garantir igualdade de oportunidades num cenário como este? “A maior parte da renda dos domicílios é proveniente do trabalho. Aquecendo o mercado de trabalho, gerando oportunidades, vagas e melhores salários, com empregos que tenham direitos trabalhistas, estabilidade e qualificação, incrementa-se o rendimento das famílias. E este é um dos fatores que combate a miséria e a desigualdade”, afirma Vinhaes.

“Somamos esforços para produzir pensamento crítico, oportunidades e propostas para diminuição da desigualdade. As entidades que participam são muito atuantes e cada uma delas vem realizando um ótimo trabalho para buscar diálogo com autoridades, com o Congresso, ministros, para participarmos deste debate”, conta Flávia.

Mas há outras formas de combate à miséria e à desigualdade que devem andar de forma paralela ao aquecimento do mercado de trabalho. “Os programas de transferência de renda mitigam uma das dimensões de vulnerabilidade social, que é a insuficiência de renda. Eles atingem de uma forma mais direta as famílias de mais baixa renda, particularmente aquelas que recebem de um quarto a meio salário mínimo”, aponta Flávia. “A Previdência também é fundamental na composição da renda, principalmente das pessoas acima de 60 a 65 anos. No Brasil, a pobreza da população mais idosa é muito baixa se comparada aos demais países”.

Uma das maiores dificuldades na busca pela justiça social é quebrar o ciclo de pobreza intergeracional. As causas deste fenómeno são várias e muitas vezes passam por fatores estruturais, que englobam a discriminação no mercado de trabalho, a falta de acesso à educação e serviços de saúde e as moradias precárias. Famílias em situação de pobreza tem recursos limitados, o que dificulta para investir em oportunidades de melhoria de vida. Neste sentido, programas de transferência de renda, como o Bolsa-Família, possuem um papel importante na medida em que colocam recursos na mão de quem não os tem.

“Os programas de transferência de renda mitigam uma das dimensões de vulnerabilidade social, que é a insuficiência de renda. Eles atingem de uma forma mais direta as famílias de mais baixa renda, particularmente aquelas que recebem de um quarto a meio salário mínimo”, aponta Flávia Vinhaes.

“Há várias dimensões da pobreza. Há a insuficiência de renda, mas quando olhamos como uma questão multidimensional, há outros fatores que impactam na questão da pobreza”, comenta a vice-presidente do Cofecon. “Uma pessoa com a renda relativamente baixa em comparação às demais, mas que tenha acesso a alimentação, saneamento, água, moradia, informação e cujos filhos estejam na escola, isso diminui o que chamamos de pobreza multidimensional, e a atuação do Estado é imprescindível na oferta desses serviços públicos, impedindo ou minorando a pobreza intergeracional”.

Flávia aponta que numa família que não tem acesso a saúde, alimentação e educação, a atividade laboral das pessoas também será comprometida, desempenhando trabalhos com menor produtividade. “Ainda que a renda de programas de transferência não seja elevada, se com as contrapartidas ela garantir que esses filhos estejam na escola, com o cartão de vacinação em dia, com o pré-natal e com acompanhamento nutricional, é uma forma de garantir que a próxima geração estará mais bem preparada”, aponta Vinhaes.

Embora a economista veja o mercado de trabalho como algo de grande importância para garantir justiça social, ela aponta a necessidade de contar com serviços públicos de qualidade. “A função do Estado é muito importante, provendo saúde, educação, saneamento e melhoria das condições de vida, para que a renda não seja toda comprometida com estes serviços que são básicos na vida de todo cidadão”, comenta.

Alcançar a justiça social num país desigual como o Brasil é um desafio que envolve diversos fatores. São muitas as áreas que precisam ser trabalhadas a fim de garantir uma melhor qualidade de vida para a população. Entre um passo e outro, estamos longe de alcançar a justiça social? “Sim, porque o Brasil é um dos países mais injustos do mundo”, responde a vice-presidente do Cofecon. “Realmente não é uma tarefa fácil, não é para amanhã, mas é importante caminhar nesta direção. Já sabemos os passos que temos que dar, mas às vezes a correlação de forças não permite. Há um caminho longo pela frente que deve ser trilhado com sabedoria, responsabilidade e civilidade para garantir melhor condição de vida e maior justiça social à população”.

“A função do Estado é muito importante, provendo saúde, educação, saneamento e melhoria das condições de vida, para que a renda não seja toda comprometida com estes serviços que são básicos na vida de todo cidadão”, comenta a economista.

O Cofecon coordena o Fórum Nacional pela Redução da Desigualdade Social, que reúne cerca de 30 entidades nacionais para o debate de ações que permitam diminuir esta mazela tão presente na economia brasileira. As ações do Fórum estão pautadas na mudança do modelo tributário brasileiro, na preservação e ampliação dos direitos sociais e das políticas públicas de valorização do trabalho e da educação, no reforço da função social do estado e na ampliação da democracia e da participação social. Flávia Vinhaes foi a coordenadora do Fórum no ano passado.

“Somamos esforços para produzir pensamento crítico, oportunidades e propostas para diminuição da desigualdade. As entidades que participam são muito atuantes e cada uma delas vem realizando um ótimo trabalho para buscar diálogo com autoridades, com o Congresso, ministros, para participarmos deste debate”, conta Flávia. “É um debate que interessa a todos. Temos expertises, conhecimento, pessoas muito qualificadas que podem trazer grandes contribuições ao debate, propondo questões inovadoras – porque com os desafios que temos, precisamos ser criativos.