Podcast Economistas, com Lucas Ferreira Lima: “É preciso pensar nos limites do planeta”

Economista aborda um modelo que considere os limites planetários. “Não é só a economia que produz bem-estar. O ecossistema também, e ele está produzindo menos”, argumenta Lima

Está no ar mais uma edição do podcast Economistas, e o tema desta vez é economia, sociedade e meio ambiente. A quantidade de crises causada pelas condições climáticas tem aumentado muito ao redor do mundo, e cada uma delas gera uma série de impactos econômicos e sociais. Quem fala sobre o assunto é o economista Lucas Ferreira Lima, doutor em desenvolvimento econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

No início do mês de maio o Rio Grande do Sul foi afetado por fortes chuvas, que causaram enchentes nas cidades pertencentes às bacias de diversos rios, entre eles o Taquari, o Jacuí e o Rio dos Sinos. Quando a água desceu na direção do Guaíba, também provocou uma enchente histórica na capital do estado, Porto Alegre, e na região metropolitana. E conforme essa água se desloca na direção da Lagoa dos Patos, antes de chegar ao Oceano Atlântico, também vai inundando cidades do litoral e do sul do estado.

Para falar sobre o meio ambiente, é preciso destacar que o ano de 2023 foi o mais quente já registrado. A temperatura média do planeta esteve 1,45 grau celsius acima do nível pré-industrial, com uma variação de 0,12 grau para mais ou para menos. Para se ter uma ideia da importância deste número, o Acordo Climático de Paris, negociado em 2015 e assinado no ano seguinte por mais de 190 países, estabelece como meta de longo prazo manter a média da temperatura global abaixo do limite de dois graus celsius acima dos níveis pré-industriais e, de preferência, limitar este aumento a 1,5 grau, reconhecendo que isso reduziria substancialmente os efeitos das mudanças climáticas.

“Temos concentrações específicas de três gases que causam efeito estufa, que são o carbônico, o metano e o óxido nitroso. O carbônico a partir dos combustíveis fósseis, o metano a partir da criação de gado”, pontuou Lima. “Precisamos rever a questão da elevação do nível dos oceanos, cujo rito mais do que dobrou em relação aos registros da década de 90; a questão da segurança alimentar; e as populações vulneráveis, decidir o que fazer com elas”.

A elevação do nível dos oceanos, citada por Lima, é um dos indicadores usados no debate. Entre 1993 e 2002 a média anual era de 2,13 milímetros por ano; já no período entre 2003 e 2012, ela subiu para 3,33 milímetros; e entre janeiro de 2014 e dezembro de 2023 foi de 4,77.

Outra consequência na elevação do número de desastres climáticos está na quantidade de pessoas que sofrem de insegurança alimentar. Dados da FAO (organismo das Nações Unidas para a agricultura e alimentação) apontam que em 2021 havia 924 milhões de pessoas enfrentando insegurança alimentar em níveis agudos – um aumento de 207 milhões em dois anos.

Chuva no Rio Grande do Sul, seca na Amazônia

O Rio Grande do Sul foi afetado por chuvas torrenciais no início de maio, mas não se pode esquecer que o estado também passou por outras catástrofes climáticas no ano passado. Por outro lado, a Amazônia viveu uma seca histórica, com a bacia do rio Amazonas chegando aos níveis mínimos em mais de 120 anos de medição. Neste cenário, Lima alertou para a necessidade de modelos econômicos adequados ao Século XXI.

“Não podemos replicar modelos que serviram anteriormente. Hoje a realidade é outra. Algo que acontecia uma ou duas vezes no século agora acontece uma ou duas vezes na década ou até mais”, ponderou o economista. “Vivemos o ano passado o El Niño, que é um período que intensifica as chuvas no Sul e a seca no Norte, mas é cada vez mais constante. O que garante que não teremos no próximo ano esta magnitude de chuvas no Sul ou de secas na Amazônia?”

O economista defende um modelo econômico baseado em três pilares: prudência ecológica, justiça social e uma economia solidária e ecossuficiente. Ele diferencia os conceitos de ecoeficiência e ecossuficiência: enquanto o primeiro tem foco em produzir mais com menos recursos, o segundo envolve uma transformação da economia dentro dos limites planetários. E para respeitar estes limites, são necessários cinco passos: reverter a perda da biodiversidade; reduzir as emissões do sistema agroalimentar; alimentar a humanidade com as terras agrícolas já existentes; trabalhar com o sequestro de carbono, medida cuja principal forma de realização é o reflorestamento; e aumentar a produtividade das culturas deixando de utilizar agroquímicos, que são fontes de emissão de gases do efeito estufa.

Lima também abordou a finalidade da economia, que é a geração de bem-estar. Ele utilizou um modelo no qual as transformações econômicas da matéria prima e da energia (os chamados inputs) seriam convertidas em bem-estar. No entanto, estas mesmas transformações produzem resíduos, que são a matéria e a energia descartadas.

“E não é só a economia que produz bem estar – e é onde a econômica falha grandemente. O ecossistema produz bem-estar, e está inclusive produzindo menos, está gerando crises climáticas”, argumentou Lima. “Nós queremos crescer, crescer, mas ninguém pergunta para que e como. Todos comemoram um crescimento de 2%, 3%, 4%. Crescer por quê? Podemos crescer produzindo remédios, alimentos, mas também aumentando a produção mineral, ampliando a produção de petróleo, produzindo cigarros. A falácia da teoria econômica é prometer que quanto maior o crescimento, maior o bem-estar. Ele não está atrelado só ao consumo de bens materiais, mas também à questão ecossistêmica”.

Neste cenário, os economistas têm um papel, devendo desempenhar duas tarefas complexas: parar o crescimento sem gerar uma crise e recriar os padrões de consumo. “Não dá para pensar na questão do emprego, da desigualdade social, da inserção da mulher, sem pensar nos limites do planeta. A macroeconomia keynesiana da década de 1930 já não faz sentido”, questionou Lima. “A segunda questão é a das expectativas de consumo, que o mais difícil de fazer. O que é colocado no marketing é: quanto mais melhor. É a ideia da maximização neoclássica”. O economista citou um estudo sobre aumento de renda e felicidade – um gráfico que faz uma curva em U invertido. “Gera felicidade nos estágios iniciais, mas quando chega num determinado momento, os acréscimos marginais de renda não geram acréscimos de felicidade na mesma magnitude”.

O podcast Economista pode ser ouvido na sua plataforma favorita ou no player abaixo. Quer se aprofundar mais sobre o assunto? Assista a apresentação realizada pelo economista Lucas Ferreira Lima no dia 07 de maio de 2024. Ela foi transmitida ao vivo e encontra-se disponível no canal do Cofecon no Youtube, e pode ser acessada clicando AQUI.