Artigo: As perspectivas econômicas para 2024 e os planos de investimentos – Novo PAC e Nova Indústria Brasil
Por André Paiva Ramos
A perspectiva atual de crescimento da economia brasileira para 2024 divulgada pelo Relatório Focus é de cerca de 1,6%, inferior ao registrado em 2023. Nos últimos meses, foi verificada uma tendência de desaceleração no ritmo de crescimento, o que tem gerado preocupação no Governo Federal, especialmente devido aos potenciais impactos nas eleições municipais que ocorrerão neste ano. Também não há perspectivas de um crescimento robusto da economia internacional. Além disso, há projeções no mercado de que ocorra uma safra e um saldo da balança comercial menores que os verificados em 2023. Como as políticas monetária e fiscal serão contracionistas ao longo de 2024, o Governo tem divulgado medidas para impulsionar o crescimento por meio de planos de investimentos, como o Novo PAC e o Nova Indústria Brasil, oferta de linhas de crédito, principalmente do BNDES, e de investimentos das estatais, como da Petrobras. Caso esses planos e essas medidas sejam efetivas, o desempenho da economia ao longo de 2024 pode superar as atuais expectativas de crescimento econômico.
O Governo Federal anunciou recentemente o Plano Nova Indústria Brasil, visando a dar sequência à sua diretriz de neoindustrialização da economia brasileira. O objetivo desse Plano, em conjunto com o Novo PAC e o Plano de Transição Ecológica (PTE), é impulsionar o setor produtivo doméstico, os avanços tecnológicos e inovações e a transição energética e descarbonização. A estrutura desse plano está orientada nos conceitos de Missões Industriais, com base na combinação de diversas metas, diretrizes transversais e ações da política industrial considerando instrumentos regulatórios, fiscais e creditícios. As Missões visam a ter objetivos alinhados em termos econômicos, sociais e ambientais.
O BNDES e a Finep terão importante atuação na promoção do Novo PAC e da Nova Indústria Brasil, especialmente por meio da oferta de elevados montantes de recursos em linhas de crédito em condições compatíveis com diferentes finalidades de investimentos. De acordo com anúncio recente feito pelo governo, a projeção é que sejam disponibilizados cerca de R$ 300 bilhões em financiamentos até 2026 por meio de linhas de crédito específicas, sendo R$ 271 bilhões reembolsáveis, R$ 21 bilhões não reembolsáveis e R$ 8 bilhões por meio do mercado de capitais.
O programa Nova Indústria Brasil, o Novo PAC e o PTE são importantes iniciativas promovidas pelo governo para fomentar o desenvolvimento econômico sustentável, de curto a longo prazo, alinhado com a estabilidade macroeconômica. Devido às restrições orçamentárias, que têm impactado forte e negativamente os investimentos públicos, o governo, no bojo dos programas citados, tem implementado medidas para tentar fomentar os investimentos privados, principalmente em PPPs, em infraestrutura e em diferentes cadeias industriais. Esses planos de investimentos em implementação visam a criar condições para impulsionar e direcionar a iniciativa privada e os diferentes setores econômicos e suas cadeias produtivas, sobretudo para fomentar as inovações e avanços tecnológicos, a produção nacional, a economia verde, as exportações e a produtividade. Desta forma, a diretriz desses planos objetiva que a atuação do Estado seja feita de forma coordenada e complementar a do setor privado, focando o desenvolvimento econômico e social com responsabilidade ambiental.
No que se refere às perspectivas do consumo doméstico, o mercado de trabalho tem apresentado forte melhora, com queda na taxa de desemprego e de subutilização da força de trabalho, assim como expressiva geração de postos de trabalho formais. De um lado, a geração de postos de trabalho, as políticas sociais de transferência de renda, a valorização do salário mínimo em termos reais e a renegociação das dívidas de milhões de brasileiros com o Programa Desenrola têm impactado positivamente o consumo, especialmente na parcela da população de menor renda. Porém, de outro lado, há elevada participação da informalidade e a geração de novos postos de trabalho formais tem ocorrido com salário médio real de admissão inferior ao salário médio real de desligamento, o que reduz o potencial de crescimento do consumo. Destaque-se que o pagamento dos precatórios no final de 2023, que foi de cerca de R$ 90 bilhões, tende a ter um impacto positivo na demanda agregada ao longo dos meses.
Adicionalmente, mesmo com a inflação controlada, dentro do intervalo da meta estabelecida, e as expectativas de inflação ancoradas, o nível de preços elevado, o mercado de crédito ainda restrito e oneroso e a taxa Selic em patamar alto são fatores que também afetarão o ritmo de crescimento do consumo, especialmente de bens de maior valor. Esses fatores impactaram negativamente o nível de investimentos ao longo de 2023 e o crescimento da indústria, que segue apresentando fraco desempenho. A Indústria de transformação vem registrando queda da sua participação no PIB ao longo dos anos, restringindo-se a apenas cerca de 10%. As medidas divulgadas visam a conter e reverter a desindustrialização em curso, fomentando a geração de emprego e renda.
A perspectiva é de que ocorra a continuidade dos cortes na taxa Selic em 2024, mantendo o atual ritmo conservador até cerca de 9,0% a.a.. Desta forma, mesmo com a redução necessária da taxa Selic, a política monetária seguirá contracionista, com a manutenção de alta taxa real de juros. No entanto, o ciclo de cortes da taxa básica de juros, as renegociações de dívidas e o fortalecimento dos bancos públicos, especialmente do BNDES, são fatores que criam condições para a expansão do mercado de crédito ao longo do ano.
As preocupações acerca do desempenho das contas públicas e do ritmo de crescimento da dívida pública e sua perspectiva de estabilização permanecerão em evidência no debate público. O desempenho das contas públicas em 2023 foi relacionado, por um lado, pela desaceleração da economia ao longo do segundo semestre e pela frustração de arrecadação e, por outro, pelo aumento em termos reais dos gastos do governo propiciados pela PEC da Transição. Essa elevação dos gastos em 2023 gerou um impulso fiscal que não está previsto para 2024. A meta de resultado primário para 2024 é excessivamente rígida e possivelmente inatingível neste ano, o que tem afetado as expectativas dos agentes econômicos. Desta forma, o cenário fiscal tem ampliado os riscos políticos, econômicos e jurídicos de acionamento das sanções previstas no Novo Arcabouço Fiscal, principalmente devido à possibilidade de subestimação das despesas previdenciárias e da superestimação da receita para o orçamento de 2024. Essa situação elevou a pressão pela alteração da meta zero para uma meta crível de resultado primário, considerando um déficit.
A diretriz da política fiscal será contracionista ao longo de 2024, de forma que o Ministério da Fazenda deve implementar ao longo dos próximos meses um esforço ainda mais intensivo para tentar a aprovação de medidas arrecadatórias e para cortes de gastos em diferentes áreas de atuação. Caso ocorra frustração da arrecadação fiscal prevista pelo Governo e dependendo do tamanho de eventual contingenciamento orçamentário, os recursos destinados para políticas públicas e para programas federais de investimentos podem ser negativamente impactados, inclusive do Novo PAC. Ainda na agenda fiscal, é esperado a avanço da segunda fase da reforma tributária e uma maior pressão pela realização de uma reforma administrativa. Ademais, destaca-se que no âmbito da revisão de incentivos e desonerações tributárias, foi elaborada uma medida de incentivo fiscal ao aplicador de recursos em debêntures de infraestrutura e ao emissor desses títulos. Nesse caso, o objetivo é incentivar a emissão desses títulos e a realocação de recursos do mercado financeiro para financiar projetos de infraestrutura, inclusive em exploração de serviços públicos.
Por fim, vale pontuar que o ritmo de crescimento da economia e o desempenho das contas públicas, especialmente o cumprimento das metas e parâmetros estabelecidos, além da implementação da agenda verde, continuarão entre os principais desafios do governo Lula ao longo de 2024. Ademais, caso as medidas para impulsionar a demanda agregada, especialmente os investimentos no âmbito do Novo PAC e do Plano Nova Indústria Brasil, sejam efetivas, o desempenho da economia ao longo de 2024 pode superar as atuais expectativas e, assim, surpreender quantitativa e qualitativamente.
*André Paiva Ramos é economista. Os dados contidos no artigo se referem à data de 07 de fevereiro de 2024. Texto publicado originalmente no ICL Economia.