Nota sobre as desonerações previdenciárias
Em 2011, quando se instituiu uma desoneração da contribuição previdenciária patronal para uma série de setores da economia, o salário mínimo vinha obtendo ganhos reais que aumentaram o seu poder de compra para mais que o dobro do observado em 1995 [INPC/IBGE]. Esses ganhos, muitas vezes repassados para salários maiores e para o setor informal, não foram apenas repassados nos preços, mas também absorvidos pelas margens das empresas, promovendo uma elevação da historicamente baixa participação da remuneração do trabalho na renda do país. Ocorreu que, em alguns casos, a redução da margem comprometeria o financiamento de projetos de investimento, uma vez que grande parte é financiada com lucros retidos, que se tornariam mais escassos com as expansões das despesas com pessoal. Essa desoneração poderia evitar quedas nos investimentos, mas a ausência de metas levou apenas a perdas de receita pública, R$139 bilhões de 2012 a 2022 [RFB], sem qualquer contrapartida que resultasse em geração de empregos e crescimento econômico.
Atualmente, o Congresso Nacional aprovou a prorrogação da desoneração por mais quatro anos, sem quaisquer metas de investimentos, o que foi vetado pelo Presidente da República e será submetido a votação para derrubar esse veto. Ainda foi acrescentado um dispositivo determina que prefeituras de cidades com população inferior a 142,6 mil habitantes terão a alíquota da contribuição previdenciária sobre a folha de salários reduzida de 20% para 8%, o que representaria diminuição de receita da União estimada em R$ 9 bilhões, somente em 2024, sem exigência de qualquer benefício para aquelas populações. Os beneficiários dessa diminuição de contribuições previdenciárias patronais têm pressionado sistematicamente por sua prorrogação, com o argumento de que a sua extinção causará quedas relevantes no emprego, no setor privado, e insolvência das prefeituras menores. Ainda que convencendo vários representantes dos trabalhadores, formadores de opinião e agentes econômicos em geral, trata-se de argumento questionável.
Não há por que esperar tais reduções de emprego, pois o que termina predominando é o atendimento à demanda, mesmo que parte das contribuições previdenciárias restabelecidas possa ser repassada aos preços e parte reduza as margens das empresas. Levantamento do Ipea, divulgado no artigo OS SETORES QUE MAIS (DES)EMPREGAM NO BRASIL, deixa patente que a desoneração da folha de pessoal não evitou perdas de emprego. De 2012 a 2022, as empresas privadas desoneradas reduziram seus empregos com carteira em 13,0% (-960 mil), enquanto as não desoneradas expandiram em 6,3% (+1,7 milhão). “Entre os setores desonerados, a queda dos contribuintes nos últimos dez anos foi puxada por: construção e incorporação de edifícios (-594 mil); preparação de couros e fabricação de artefatos de couro, artigos de viagem e calçados (-137 mil); fabricação de produtos têxteis (-109 mil); confecção de artigos do vestuário e acessórios (-101 mil).” Tais resultados indicam que, mesmo com a redução de custos operacionais representada pela desoneração, para o setor de construção prevaleceram os efeitos da retração dos gastos públicos (Minha Casa Minha Vida e PAC), assim como dos gastos privados, provenientes da recessão. Para calçados, têxteis e vestuário, uma hipótese seria a perda de mercado. Em todos, metas de emprego não se sustentariam.
Contudo, o que pode ter sido e voltar a ser desfavorecido sem a desoneração são projetos de investimento, e, com isso, aumentos de produtividade, competitividade, emprego e capacidade produtiva. Metas de manutenção de emprego não seriam as mais eficazes, uma vez que a produção corrente termina se ajustando à demanda. Contrapartidas em termos de investimentos, por seu turno, fazendo com que os lucros aumentados sejam direcionados para financiá-los, poderão incentivar elevações de empregos como desdobramento.