Seminário: Mesa 2 discute impactos da maternidade no salário das mulheres
Debatedoras apontaram a maternidade como um fator decisivo na diferença salarial existente entre homens e mulheres
“Economia, Gênero e Diversidade”. Este foi o tema da segunda mesa de debates do seminário Economia, Formação, Mercado de Trabalho, Gênero e Diversidade, realizado no dia 11 de outubro pelo Cofecon. A mesa contou com a participação das economistas Maria Eduarda Tannuri-Pianto, Maria Sylvia Macchione Saes, Isabel Santos Ribeiro e Marilane Teixeira, com mediação da conselheira federal Flávia Vinhaes.
“Por muitos anos a desigualdade no mercado de trabalho era considerada como causada por diferenças de educação e escolhas educacionais. As diferenças de educação nós já superamos”, afirmou Tannuri-Pianto ao abrir sua fala. “Estas desigualdades estão ligadas à maternidade e relações das famílias”.
Ela citou os trabalhos realizados por algumas de suas alunas – um deles traz dados sobre aumento da escolaridade com recorte de raça. Um terço das mulheres brancas nascidas entre 1980 e 1989 têm nível superior, enquanto as outras têm 17% (contra 25% e 12% dos homens). “Ainda assim, as mulheres ganham menos. Esta diferença está diminuindo, ela era de 46% em 1981 e é de 25 a 26% em 2022. Fechamos 20% de diferença em quarenta anos”, constatou. “Outra aluna quis isolar o impacto da maternidade nesta determinação de salário, o que foi possível fazendo diversas comparações. Quando um filho é bebê, mulheres com filhos pequenos ganham mais que outras mulheres, trabalham menos, mas com o passar do tempo isso vai mudando, elas voltam a trabalhar mais e há mulheres ganhando 15% menos que as outras só porque tiveram filhos. Essa curva de rendimento nunca é recuperada”.
O trabalho de outra aluna abordava a quantidade de horas gastas em trabalhos de cuidados. Quando uma mulher tem cônjuge, são 5 a 6 horas semanais a mais. “As mulheres brancas, com nível superior, que têm marido com nível superior, são privilegiadas, mas ainda assim estão sempre trabalhando mais horas que os homens. E as meninas de 13 a 17 anos gastam 9 horas e meia a mais com trabalho doméstico do que os meninos”.
A professora Maria Sylvia falou sobre a conquista do direito ao voto – e, para as mulheres que não recebiam salário, o voto no Brasil continuou sendo facultativo até 1965. “Essa questão se liga ao papel da mulher, definido na sociedade, ligado à atividade doméstica e criação dos filhos. Eram tarefas nunca valorizadas como trabalho produtivo”, explicou. “O trabalho não remunerado doméstico ainda é, em grande parte, responsabilidade das mulheres, e tem um agravamento quando colocamos a questão de raça. O Brasil tem 9% do trabalho doméstico do mundo inteiro, o que significa que temos uma péssima distribuição de renda.
Maria Sylvia economista exibiu gráficos que aparecem nos trabalhos da economista Claudia Goldin, mostrando que a posição da mulher no mercado de trabalho, ao longo dos últimos 200 anos, foi uma curva em forma de U. “No início havia um papel muito grande na divisão do trabalho, essencialmente agrícola. Isso foi diminuindo até que, a partir da década de 1930, começa a haver uma ascensão no mercado formal de trabalho”, comentou. “Outro dado interessante são as disparidades de salário: no início é muito similar ao do homem; a partir do momento da maternidade, passa a ser inferior ao de outras mulheres”.
Os sintomas dessa desigualdade se expressam em menores salários e poucas mulheres em cargos de liderança. “As mulheres evitam o chamado trabalho ganancioso, que remunera melhor as atividades que demandam mais horas e são menos flexíveis. Elas precisam de mais flexibilidade e optam por isso, mesmo que ganhem menos. Elas têm maior aversão à competição. Na sociedade matriarcal, esse tipo de problema não existe”, observa. Ela também trouxe o dado de que as mulheres são responsáveis por 45% da produção de alimentos nos países em desenvolvimento, e que cerca de 90% do que as mulheres rurais recebem no campo é reinvestido na educação dos filhos. “As mulheres no campo cooperam e tendem a gerenciar bens comuns de forma mais eficiente que o mercado”.
A economista Isabel Santos Ribeiro trouxe ao debate a experiência do estado da Bahia. “Temos o sétimo PIB do Brasil, mas com uma população mal remunerada e com alto grau de informalidade. As pessoas ganham pouco, com trabalho pouco qualificado”, afirmou. “Em 2021, nós tínhamos 2,9 milhões de pessoas na informalidade na Bahia. Em muitas cidades baianas o maior empregador é o setor público, e é o que melhor remunera”.
Outro dado trazido por Isabel mostra que as empresas com 1 a 4 empregados representam 58% dos empregos com carteira assinada. “A pequena empresa carrega o emprego com baixa remuneração. É algo que o país precisa repensar”, pontuou. E trouxe a questão de gênero: “Considerando a força de trabalho, 44% eram mulheres, mas elas eram maioria entre os desempregados (55%). O resultado aparece na taxa de desocupação: 11%, no caso das mulheres, contra 6,9% dos homens. Fora da força de trabalho, 64% são mulheres”.
A professora Marilane Teixeira afirma que a ideia da neutralidade, na economia, invisibilizou as mulheres, tanto no pensamento econômico quanto do ponto de vista do pensamento delas. “Queremos repensar a economia através de outras perspectivas. Na economia feminista, a teoria da reprodução social é muito importante. Do ponto de vista do sistema, interessa ter as mulheres como papéis definidos no âmbito da casa, da família e do cuidado”, argumenta. “Vamos passar pela década da crise dos cuidados, e o que nós não queremos é que isso sobrecarregue as mulheres”.
Marilane também pontuou que as mulheres têm dificuldade de acesso ao mercado de trabalho e dificuldade para permanecer nele. “Não podemos encarar com naturalidade que 43 milhões de mulheres estejam fora do mercado de trabalho, enquanto os homens nesta situação são 22 milhões”, questionou. “No Brasil, temos 9 a 10 milhões de empregos na indústria, e 6 milhões em trabalho doméstico, sendo boa parte mulheres negras. E quando vão para o mercado de trabalho, há um processo de discriminação que é aviltante. Há critérios para avaliar desempenho, como disponibilidade. O que é disponibilidade? Jantar com cliente, fazer horas extras, viajar”. E encerrou questionando o que vale mais, o mercado ou a vida.
A mesa “Economia, Gênero e Diversidade”, segunda mesa de debates do seminário Economia, Formação, Mercado de Trabalho, Gênero e Diversidade, pode ser assistida no vídeo abaixo: