Artigo – Reinando soberano
É fato que a retomada do crescimento econômico é condição essencial para a redução da taxa de desemprego e para a elevação da renda nacional, mas não a qualquer preço. Ocorre que a retomada em curso vem acompanhada de uma persistente piora dos indicadores sociais.
Sabemos que os bancos e as grandes corporações buscam impor seus interesses ao conjunto da sociedade brasileira, e é imperativo que a vontade soberana do povo esteja acima dos anseios e receios do mercado, mas o que tem ocorrido é exatamente o oposto. O que se assistiu nos últimos meses foi uma enorme pressão do mercado financeiro sobre a arena política e sobre o judiciário.
No dia seguinte ao julgamento de Lula no TRF-4, a manchete de um grande jornal foi: “Tribunal tira Lula do jogo eleitoral”, evidenciando que a sentença contemplara o desejo do mercado financeiro de inviabilizar uma candidatura presidencial com mais de 40% dos votos válidos nas pesquisas, mas que seria uma ameaça à continuidade da agenda de reformas pró-mercado. Mais do que pôr Lula fora do jogo, o “mercado” quer vê-lo preso para, desmoralizando-o, eliminar qualquer instrumento que se oponha à sua agenda liberal. Daí a pressão sobre o próprio STF para que não reveja a questão da prisão a partir da 2ª instância.
É importante frisar que não é só o julgamento de Lula mas vários atos do Poder Judiciário têm recebido críticas e ressalvas de diversos juristas respeitados e consagrados. O Poder Judiciário não pode ser visto como algo imaculado, isento a equívocos e desvios. Pelo contrário, seu histórico sugere muita cautela ao analisarmos suas decisões.
Ao mercado financeiro interessa a politização da justiça, a judicialização da política, ou ainda a criminalização da política, para que reine soberano e, assim, imponha sua agenda de reformas. Para a economia, as consequências inevitáveis serão o aumento da brutal concentração da renda e a maior exclusão social.
Júlio Miragaya é conselheiro do Conselho Federal de Economia (Cofecon) e foi presidente da autarquia em 2016/2017.
Artigo publicado na edição de 01/02/2018 do Jornal de Brasília.